Chegamos ao término de mais um ano que parece ter percorrido a galope os seus 365 dias. Um ano difícil, no qual a duríssima disputa eleitoral fraturou famílias, abalou amizades, gerou profunda e preocupante desconfiança nas cortes superiores do país e cujo resultado aponta para um futuro de incertezas e inseguranças. Chegamos até aqui divididos e parece que seguiremos assim, infelizmente.
Jair Bolsonaro, escolhido por 49,10% dos eleitores para liderá-los na oposição, abdicou da tarefa e se recolheu a incompreensível silêncio. O sumiço do governo que termina abriu espaço para que o que chega domine sozinho a cena política, lidere negociações e avance no Congresso com afagos aos supostamente eleitos para fazer oposição. Até a Copa do Mundo, grande paixão dos brasileiros, deslocada no calendário, parece contaminada pelos maus humores políticos.
O pouco que se consegue ver em meio à densa e barulhenta polvadeira levantada pelas mais de quatro centenas de pessoas designadas para a equipe de transição, não aponta nenhuma novidade. Sobressaem rostos desgastados pelos escândalos de corrupção nas administrações passadas do Partido dos Trabalhadores e outros marcados pela incompetência, num ambiente em que o anacronismo ideológico parece ainda maior do que no passado. Não se pode esperar que comissões tão numerosas produzam algo aproveitável em 4 semanas. Impossível elaborar diagnósticos e recomendações confiáveis no exíguo prazo proposto e nesse ambiente de assembleia estudantil. O alvoroço sugere despudorada disputa por sinecuras.
Ao mesmo tempo, articula-se no Congresso a aprovação de emenda constitucional que autorize uma gastança que beira os 200 bilhões de reais! Um macabro “déjà vu” do apetite incontrolável por cargos e recursos públicos caracterizado em administrações anteriores. Não há o menor risco de dar certo, lamentavelmente. O explorado contribuinte seguirá bancando a festa.
O desconhecimento do “ethos” militar criou um falso impasse na chamada transição. As Forças Armadas são alicerçadas na hierarquia e na disciplina, como define a Constituição Federal. Instituições dessa natureza não admitem transição, nelas existe substituição. As rígidas normas éticas que sustentam aqueles fundamentos constitucionais não admitem a existência de dois comandantes em paralelo, tampouco dão liberdade para que os substitutos, mesmo quando já indicados, movam-se ou se manifestem fora de suas áreas de atribuições. Esperar que oficiais experimentados, com quase meio século de serviço quebrem seus princípios e convicções, atropelando o processo castrense de passagem de comando é ignorância ou má fé.
A hostilidade já demonstrada ao mercado e a insegurança acenada para o empreendedor, atingem os que produzem riqueza e, por consequência, salários, impostos e ingressos sociais. Sem eles, nenhum governo, em nenhum lugar do mundo, terá o que distribuir. Argentina e Venezuela estão aí, como tristes exemplos da miséria para a qual a demagogia irresponsável e o populismo eleitoreiro podem arrastar os desassistidos que se alega beneficiar.
Precisamos de futuro, o passado dos que voltam não deixou saudades.
Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.
Sergio Etchegoyen
É Presidente do Conselho de Administração do IREE Defesa & Segurança, General de Exército da reserva e foi ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (maio de 2016 a dezembro de 2018). Ingressou no Exército em 1971, na Academia Militar das Agulhas Negras, e foi declarado Aspirante a Oficial de Cavalaria em 1974. Como oficial-general, de novembro de 2004 a maio de 2016, comandou a 4ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, foi Assessor Especial Militar do Ministro de Estado da Defesa e cumulativamente chefe do Núcleo de Implantação da Estratégia Nacional de Defesa, comandou a 3ª Divisão de Exército, exerceu as chefias do Departamento-Geral de Pessoal e do Estado-Maior do Exército.
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