SuperBoy, Papai Noel e Mauricio – IREE

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SuperBoy, Papai Noel e Mauricio

Ricardo Dias

Ricardo Dias
É luthier, escritor e músico



Há alguns dias tivemos uma polêmica interessante: o filho do Super Homem é bissexual. Sensação nas hostes quadrinísticas! O que será da civilização judaico-cristã ocidental? Os defensores da família, sempre atentos, assinalam o mau exemplo. E será? Anos e anos de super heroínas de shortinhos curtos e decotes teriam sido responsáveis pela sua deles heterossexualidade? Basta um mero beijinho entre homens para destruir tudo? É preciso ficar atento e forte, já dizia alguém melhor que eu.

Mas a sexualidade é um tema polêmico. Nosso amado presidente, por exemplo, declarou que não correu risco dos filhos virarem gays por ser “um pai presente”. Ou seja, se não tomasse conta, os meninos iam sair desvairados por aí, soltando a franga… Mas o que é ser presente nesse caso?

 

-Olha aqui, vou ter que sair, desculpem mas vou ter que amarrar vocês, um em cada quarto.

-Mas papai, por quê?

-Mais tarde vocês vão me agradecer.

-Mas vem um coleguinha brincar conosco!

-Ne-ga-ti-vo! Nada disso! Sem mim, aqui ninguém entra! Papai vai se encontrar com os amigos, dar uns tiros, fazer uma sauna e já volta para desamarrar vocês.

 

Sempre achei o nome “homofobia” perfeito. “Fobia” significa aversão mas também significa medo, e é medo que nossos machões sentem, muito mais que aversão. Medo de quê, exatamente? Bem, muitos deles argumentam que se um gay “encontrar a mulher certa”, “se cura”; well, o medo deles pelo visto é encontrar o homem certo, já que é tão simples mudar de time. E toda essa maluquice acaba revertendo em racismo, também. Nosso esclarecido líder por diversas vezes demonstrou sua ideia de superioridade sobre negros e índios; àqueles ele devota uma familiaridade desrespeitosa, assim como aos seus gays de estimação: os trata com desprezo, simulando intimidade para se mostrar “sem preconceito”. Aos índios, ele demonstra seu poder informando que não terão “nem um centímetro de terra”. Acho melhor essa cretinice explícita que ficar fazendo Ú Ú Ú batendo com a palma da mão na boca ou algo assim. É mais honesto.

 

Essa confusão com o filho de Lois Lane lembra o que aconteceu alguns natais atrás: um shopping contratou um senhor negro para ser Papai Noel. A tradicional família cristã declarou que “não existe Papai Noel negro”. Ah, bom, a verdade precisa ser preservada, o VERDADEIRO Papai Noel não é negro. Eu conto ou vocês contam? Para eles, Papai Noel, mamadeira de piroca, kit gay, tudo isso é real. Respeitemos, não se debocha da deficiência alheia – não temos como saber se é cognitiva ou de caráter. Basta surgir um preconceito que eles saem correndo para adotar.

 

E falemos de voleibol. Meu pai jogou nos anos 50, é um esporte presente em minha vida. E acompanhei todo seu crescimento desde quando o saudoso Luciano do Vale (“Luciano do Volei”) ajudou a popularizá-lo, favorecido pela mudança nas regras (antigamente o jogo durava horas, era bem chatinho). Torci com a geração de prata, os saques geniais, craques em sequência, times maravilhosos, masculinos e femininos. Até que um dia…

O time brasileiro, para ter mais facilidade à frente no torneio, entregou um jogo. Aquilo me derrubou, nunca mais torci para o time masculino. Eu acho esporte uma coisa sagrada, não se brinca com a deusa Vitoria. Sem Bernardinho, o técnico de então, tentei torcer nesta última olimpíada, graças ao Douglas, que sozinho contrabalançava seus colegas de time torcedores do 17. Mas TENHO que falar do Mauricio de Sousa!

 

Após uma vida de conquistas, ele abre agora uma nova frente de luta pelo que é certo, correto, justo. Mauricio agora luta pela ecologia. Aos 86 anos, completados há pouco, batalha o bom combate. Ao longo da carreira foi criando personagens que dão representatividade a crianças de todas as minorias sociais, e prepara um personagem ligado à homossexualidade – tema complexo pois suas criações nunca passam pela sexualidade. Ainda está se decidindo sobre como, mas já disse que fará. E fala do filho gay com orgulho e carinho, tendo posado com ele e o genro há alguns anos. Para alguém de sua geração o tema é complicado, mas ele, ser superior que é, passa batido por qualquer conflito e foca no essencial, o amor.

 

Sim, estou falando do Mauricio de Sousa, criador da Turma da Mônica; acham que iria perder tempo com algum ser inferior? Eu, hein!

 

 

Dedicado a Pipe e Jorge



Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.

Ricardo Dias

Tem formação de Violonista Clássico e é luthier há mais de 30 anos, além de ser escritor, compositor e músico. É moderador do maior fórum de violão clássico em língua portuguesa (violao.org), um dos maiores do mundo no tema e também autor do livro “Sérgio Abreu – uma biografia”.

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