A eleição de 2018 ficará marcada pela ascensão da chamada “nova política” no Congresso Nacional. Foi a maior renovação parlamentar deste ciclo democrático, com impressionantes 47% de novatos na Câmara dos Deputados. O fenômeno de renovação também ocorreu em alguns Executivos estaduais, como no Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Nesses dois grandes colégios eleitorais, as surpreendentes vitórias dos novatos Wilson Witzel (PSC) e Romeu Zema (NOVO) mostraram que a insatisfação dos eleitores com o status quo da política institucional – e mesmo com a política em sua definição mais genérica – não se restringia apenas ao âmbito parlamentar. Inclusive o pleito presidencial pode ser interpretado dentro dessa chave de análise, se considerarmos o discurso vencedor do então candidato Jair Bolsonaro de negação da política e do agir político.
Afora o caráter verdadeiro ou falso da narrativa da “nova política” – falso, na minha opinião –, a atual complexa situação do governador do Rio de Janeiro é bastante exemplar. O desconhecido ex-juiz Wilson Witzel foi eleito com um discurso colado ao de Jair Bolsonaro, de combate à corrupção e de promessa de uma limpeza das “práticas sujas da velha política”. Contudo, uma breve análise dos seus primeiros 18 meses de gestão mostra que nada disso funcionou.
Witzel enfrenta nesse momento um duro processo de impeachment na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ), aberto com o “sim” de 69 dos 70 deputados da Casa (houve uma abstenção na votação). Independentemente do resultado do julgamento pelos crimes dos quais é acusado na Operação Placebo e Favorito – de envolvimento em desvios de verbas na Saúde do estado –, é bastante surpreendente que a situação tenha chegado a esse ponto, quando sabemos que a governabilidade em arenas estaduais é relativamente simplificada, exigindo um mínimo de talento para a gestão da coalizão de governo.
Pelo que vimos, não há apoiadores a Witzel no Legislativo e o governador da “nova política” navega em quase total isolamento político. A opção por um secretário de articulação de péssimo trato com a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), o recém exonerado Lucas Tristão, que montou dossiês para ameaçar parlamentares, é mais um capítulo que demonstra o fracasso desse “modelo” de gestão, em que não há gestão, já que não faz aquilo pelo qual governos estaduais são eleitos: governar e executar políticas públicas.
A crise hídrica com qual o estado do Rio de Janeiro “estreou” 2020 já revelava indícios de um Executivo enfraquecido, quando houve a rejeição de uma simples nomeação de um conselheiro da Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico. E a crise trazida pela pandemia de COVID-19 veio com força no segundo ano da gestão de Witzel e colocou o estado fluminense no epicentro da crise sanitária.
Witzel poderá marcar seu nome na história institucional de impeachments de governadores no Brasil. Até hoje há somente um caso, bastante singular, no estado do Alagoas em 1957. Mesmo nesse caso, houve reversão do processo.
Nos últimos dias, o governador do Rio de Janeiro vem tentando reverter seu isolamento com a oferta de cargos e benefícios para alguns deputados da Alerj em troca de apoio. Contudo, pode ser tarde para que finalmente entenda que a atividade de formação de governos e a governabilidade incluem minimamente a participação do Legislativo no processo.
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Carolina de Paula
É doutora em Ciência Política pelo IESP/UERJ, Diretora Executiva do DataIESP e consultora da UNESCO. Coordenou o "Iesp nas Eleições", plataforma multimídia de acompanhamento das eleições de 2018. Foi coordenadora da área qualitativa em instituto de pesquisa de opinião e big data, atuando em diversas campanhas eleitorais e pesquisas de mercado. Escreve mensalmente para o IREE.