Ódio aos pobres – IREE

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Ódio aos pobres

Juliano Medeiros

Juliano Medeiros
Presidente nacional do PSOL



Na primeira semana de outubro, Jair Bolsonaro protagonizou um dos episódios mais revoltantes em seus quase três anos de governo. Usando de suas prerrogativas legais, o presidente vetou projeto de autoria da deputada Marília Arraes (PT/PE) aprovado em setembro pela Câmara dos Deputados que previa a entrega de absorventes higiênicos a estudantes de baixa renda de escolas públicas, pessoas em situação de rua ou em privação de liberdade.

Reforçando os argumentos fiscalistas de sua equipe econômica, Bolsonaro afirmou que foi “obrigado” a vetar o texto aprovado pelo Legislativo porque ele não teria estabelecido fonte de custeio para a aquisição dos itens. O texto aprovado, no entanto, previa que o dinheiro viria dos recursos destinados pela União ao Sistema Único de Saúde (SUS) e, no caso das detentas, do Fundo Penitenciário Nacional.

A questão, portanto, não é a origem dos recursos para o financiamento da medida. O governo tem aumentado sistematicamente gastos aquilo que considera prioritário enquanto asfixia as políticas sociais. No auge da pandemia, o Congresso Nacional autorizou a injeção de pelo menos R$ 700 bilhões na economia, através da PEC que flexibilizou as regras fiscais e medidas como o Auxílio Emergencial. Quando considera necessário, o Estado viabiliza recursos.

O problema de fundo, portanto, não está na ausência de fonte de custeio do projeto, mas o ódio do governo Bolsonaro às mulheres, especialmente as pobres, uma característica dos governos de extrema-direita em todo o mundo. Estimativas apontam que as medidas previstas no projeto custariam cerca de R$ 80 milhões por ano. Façamos uma breve comparação.

Só o aumento do orçamento do Ministério da Defesa para 2021 é de R$ 1,7 bilhão. Desses, R$132 milhões são destinados a verbas discricionárias do Ministério da Defesa. Esse valor não inclui os soldos dos militares. O leitor pode argumentar, no entanto, que a modernização das Forças Armadas é um elemento estratégico para o país, considerando, por exemplo, a condição lamentável de nossa frota de blindados. Mas o que é de fato prioritário nesse momento?

Usemos outra comparação. Desde o início de sua gestão, os gastos de Bolsonaro com cartão corporativo ultrapassaram os R$ 50 milhões de reais. Consideremos que nesses gastos não estão incluídos os recursos necessários para a manutenção da residência oficial ou do Palácio do Planalto, que contam com orçamento à parte. Tampouco estão incluídos gastos com viagens oficiais. Basicamente, Bolsonaro tem “torrado” recursos públicos para financiar suas patéticas “motociatas” e outras atividades políticas pelo país.

Está evidente que Bolsonaro e seus ministros têm verdadeiro horror aos mais pobres. As declarações do presidente atestam fartamente essa afirmação. Mas não bastasse o veto ao PL aprovado pelo Legislativo, Bolsonaro ainda afirmou que, caso o Congresso Nacional derrube o veto presidencial, irá tirar os recursos da saúde e da educação. Ou seja, para os militares, tudo. Para os pobres, nada.

O veto de Bolsonaro acontece na mesma semana em que a base do governo no Congresso Nacional aprovou um corte de 92% no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. O projeto de Bolsonaro é sabotar o bem-estar do povo brasileiro, seja impedindo a pronta aquisição de vacinas, seja subfinanciando as políticas sociais, seja vetando projetos que podem atenuar o sofrimento das mulheres pobres.

É por essa razão que não basta derrotar Bolsonaro nas urnas ou nas ruas. É preciso banir o projeto de morte da extrema-direita da política brasileira.



Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.

Juliano Medeiros

Historiador, mestre em História e doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília. Foi Diretor-Presidente da Fundação Lauro Campos (2016/2017) e desde 2018 é Presidente nacional do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). É autor e co-organizador dos livros "Um partido necessário: 10 anos do PSOL" (FLC, 2015) e "Cinco Mil Dias: o Brasil na era do lulismo (Boitempo, 2017).

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