Se já havia dúvidas sobre como o governo de Jair Bolsonaro faria a articulação com o Congresso, a queda de Gustavo Bebianno, até então ministro da Secretaria-Geral da Presidência, deixa tudo ainda mais nebuloso.
A forma como a crise em torno das denúncias de corrupção contra Bebianno foi conduzida pelo Planalto mostrou falta de habilidade do presidente para lidar com a sua própria base, além de evidenciar a influência de seus filhos no governo.
A primeira baixa no ministério de Bolsonaro ocorreu apenas 48 dias após o início da administração. O presidente não foi claro sobre os motivos da demissão. Alegou assunto de “foro íntimo”, o que alimentou as especulações sobre a briga com um dos mais próximos colaboradores.
O general da reserva Floriano Peixoto foi nomeado para o lugar de Bebianno. É o oitavo militar a assumir um posto importante no governo.
As denúncias contra o PSL
Bebianno está envolvido nas suspeitas de uso indevido do fundo eleitoral por parte do PSL na campanha de 2018, mas a mensagem do Planalto sobre a exoneração não tocou no assunto.
Tampouco há indicação de que alguma providência será tomada a respeito do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, citado nas mesmas denúncias sobre uso de candidatas laranjas pelo partido de Bolsonaro.
O que transparece é uma disputa política entre Carlos Bolsonaro e Bebianno, que teve um papel importante na campanha presidencial. Há sinais de que a desavença entre os dois vem desde o período eleitoral.
O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, último civil hoje com assento no Palácio do Planalto, faz parte das alianças articuladas por Bebianno.
A crise com o ministro
Em meio ao noticiário negativo e com Jair Bolsonaro prestes a sair do hospital, Bebianno tentou amenizar a crise dizendo que, só no dia 12 de fevereiro, havia falado três vezes com o presidente. No dia seguinte, foi chamado de mentiroso por Carlos Bolsonaro, acusação endossada por Jair Bolsonaro.
O episódio acabou por desencadear o processo de demissão. Um dia depois da exoneração, no entanto, três áudios de Bolsonaro a Bebianno foram vazados para a imprensa, provando que os dois, de fato, haviam se falado.
A formalização da demissão demorou quase quatro dias para sair. Nesse meio tempo, Bebianno fez ameaças veladas ao presidente. Ele teria exigido de Bolsonaro a gravação de um vídeo elogioso e se irritado com o fato de as imagens não terem sido postadas nas redes sociais.
“Eu trabalhei para eleger o presidente e, por consequência, acabei ajudando um monte de gente a ser eleita também. (…) Se não fosse o meu trabalho, o major Olímpio não teria sido eleito, o Eduardo Bolsonaro não teria sido eleito, nem a Joice Hasselmann. Faço questão de dizer isso”, declarou ao Estadão no dia 13 de fevereiro.
Bebianno e as reformas
Bebianno era o canal de diálogo dos parlamentares com o núcleo político do Planalto, e contou com o apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na crise que culminou na sua exoneração.
Até o momento, o governo sinaliza com dois planos prioritários: a Reforma da Previdência e o pacote de segurança apresentado pelo ministro da Justiça Sérgio Moro.
A Reforma da Previdência e o desajuste na base do governo que a demissão de Bebianno pode causar é a maior preocupação de Maia. O presidente da Câmara chegou a criticar em entrevista à GloboNews a forma com que o presidente Jair Bolsonaro lidou com a situação.
“Se ele [Jair Bolsonaro] está com algum problema, ele tem que comandar a solução, e não pode, do meu ponto de vista, misturar família com isso porque acaba gerando insegurança, uma sinalização política de insegurança para todos”, afirmou o presidente da Câmara para o canal.
Reforma da Previdência
A dedicação de Maia para aprovar a Reforma da Previdência, que é continuidade do modelo debatido durante a gestão de Michel Temer, é um fator que pode ajudar o governo independentemente da capacidade de articulação do próprio Planalto. E tudo indica que restará ao presidente da Câmara contar mais com sua própria habilidade política.
Sem Bebianno, ainda resta para Maia a comunicação com o ministro da Economia, Paulo Guedes, que apoiou sua reeleição para a presidência da Câmara.
Já Bolsonaro parece ainda apostar na capacidade de se comunicar com o eleitorado para defender a sua agenda no Congresso e anunciou que entregará pessoalmente o texto da Reforma da Previdência aos parlamentares na quarta-feira, 20 de fevereiro.
Articulação política
Não se sabe ainda como a demissão de Bebianno irá refletir na relação de Bolsonaro com demais aliados no Congresso. Segundo relatos na mídia, o episódio foi visto por aliados como sinal de deslealdade do presidente.
Há quem veja na disputa entre Carlos Bolsonaro e Bebianno uma queda de braço entre a ala que quer manter o clima de campanha na relação com a população e o grupo que quer que o governo comece a funcionar.
Se isso fizer realmente sentido, o desfecho da crise é um mau sinal para agenda política do governo, com consequências que podem respingar principalmente nas promessas de fazer um ajuste fiscal.
Por Samantha Maia
Leia também

Precisamos de um prefeito com experiência
Continue lendo...
Os limites da “nova política” no estado do Rio de Janeiro
Continue lendo...
As adversidades no caminho do partido Republicanos
Continue lendo...