O Eleito, A Noviça Rebelde e a Inocência – IREE

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O Eleito, A Noviça Rebelde e a Inocência

Ricardo Dias

Ricardo Dias
É luthier, escritor e músico



Ai ai ai… Escrever com antecedência gera um estresse tremendo. Quem é nosso presidente hoje? Será que consegui virar os votos que tentei? Será que não podia ter feito algo mais? Será que o Ciro tomou jeito? Será que foi para Paris?

Circula na internet um texto escrito por um bolsominion logo após as eleições, em que ele simula estar um ano no futuro – em 2019, portanto – e lá era o paraíso. Escolas cívico-militares por todos os lados, fim do PT e do PSOL, prisão de Lula e Dilma, Moro no STF, dólar a 1,50, gasolina a quase isso… A realidade todos conhecemos – ou melhor, todos menos 30% da população que ainda vota nessa criatura. Esses vivem numa realidade paralela, onde nos defendemos do comunismo e salvamos nossa liberdade, além de pleno emprego. Então resolvi especular sobre como seria o dia 3 de outubro, segunda-feira, após a eleição.

Lula eleito:

Orgias ainda em andamento em praça pública, sem data para acabar: homem com mulher, mulher com mulher, homem com homem, cachaça liberada saindo pelos chafarizes, clubes de tiro vazios, escolas cívico-militares com as árvores caiadas de vermelho, motoristas de Uber dando bananas para a empresa, fabricantes de churrasqueira soltando fogos, fabricantes de fogos soltando fogos, fabricantes de armas soltando imprecações.

A famiglia fazendo liquidação dos 107 imóveis, Moro segurando o próprio orifício anal entre os dedos, e Lula, de ressaca, abrindo os sigilos de 100 anos.

Janja dançando ao lado.

 

Tendo segundo turno:

Ciro vai para Paris.

 

Bolsonaro eleito:

Nos céus, 4 cavaleiros montados em cavalos coloridos: um preto, um branco, um vermelho e um amarelo. Bolsonaro tenta montar em todos mas acaba preferindo uma moto. Declara que agora os cidadãos de bem são obrigados a ter, cada um, 12 armas, e que os comunistas – toda a população que se lhe opõe – serão obrigados a andar com uma estrela vermelha costurada no peito. Ampliam o negócio de corretagem de imóveis. Bolsonaro impõe sigilo de 100 anos a todos os seus atos. Inclusive decretos.

Michelle tira foto com seu instrutor de lambaeróbica.

 

Esses dias, um garoto de 15 anos do MBL se infiltrou numa manifestação de esquerda e provocou Boulos, tentando fazer parecer que foi agredido por ele. Um policial tentou prender o candidato, mesmo sendo proibido fazê-lo a menos de 15 dias das eleições (a não ser em flagrante, o que não houve). Boulos deu-lhe uma aula de leis, sem muito sucesso, até que dois advogados criminalistas conseguiram demover o agente da lei e da ordem de seu intento. Diálogo surreal:

-Não tenho que ir para a delegacia!

-Tá com medo de quê?

-Se me chamar para ir ao Ibirapuera eu também não vou! Não tenho medo, só não tenho nada que fazer lá!

Adivinhem de quem o policial é apoiador…

O que mais assusta é saber que uma criança é capaz de se portar desse jeito, com o beneplácito dos pais. Traidor é uma raça ruim. De certa forma me lembra um casalzinho romântico de A Noviça Rebelde, ambos de 16, quase 17 anos. O rapaz, apaixonado, era da juventude hitlerista e denunciou a família da amada.

Sim, eu vejo semelhanças. Ideologias que corrompem crianças.

Falando em crianças, uma matou o irmão. O pai, CAC (“Colecionador, Atirador, Caçador) se descuidou. Outra invade uma escola (cívico-militar) e mata uma cadeirante. A toda hora tragédias acontecem por causa da maior facilidade com armas. A criminalidade (por outras razões) diminui, mas a quantidade de mortes por armas de fogo aumenta. O crime organizado aproveita a não fiscalização das Forças Armadas. Aí um canalha assassina a esposa num crime passional. Um CAC, diga-se. Um repórter, adivinhem apoiador de quem, vê uma tatuagem e manda o assassino levantar a manga para que ele possa fotografar o rosto de Lula pintado ali. Pronto. Os assassinatos cometidos por bolsonaristas, os crimes dos CACs, são TODOS igualados pelo presidente a um idiota que matou a mulher.

Que, claro, menciona isso num debate.

Ia desfiar os escândalos da semana, mas me dei conta que, agora, não adianta. Se Lula foi eleito, já há provas suficientes para sepultar de vez esse período nojento da história.

Se não foi, nada adianta.

Enfim, todos que me lêem sabem da minha ansiedade, pois no momento em que batuco no computador estão todos com a mesma sensação. Como será o amanhã? Ou, como está sendo hoje? A agonia é tanta que meio que passou batido um enorme momento da República: Dilma Rousseff foi absolvida. NADA havia contra ela, nem mesmo as tais pedaladas (cometidas por quase todos os seus algozes). E me penitencio, envergonhado, pois num primeiro momento acreditei em sua culpa. Daqui meus mais sentidos pedidos de perdão a essa senhora que, se não foi minha presidente favorita, sempre mereceu minha admiração desde que vi AQUELA foto, em que os “juízes”que a condenam estão escondendo seus rostos e ela, altaneira, olha diretamente para todos. Se algum bom cristão puder, que encaminhe estas mal-traçadas a ela.

E que beije suas mãos em meu nome.



Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.

Ricardo Dias

Tem formação de Violonista Clássico e é luthier há mais de 30 anos, além de ser escritor, compositor e músico. É moderador do maior fórum de violão clássico em língua portuguesa (violao.org), um dos maiores do mundo no tema e também autor do livro “Sérgio Abreu – uma biografia”.

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