Juros altos não reduzem a inflação, mas deterioram as contas públicas – IREE

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Juros altos não reduzem a inflação, mas deterioram as contas públicas

Juliane Furno

Juliane Furno
Professora de Economia UERJ



Data de março de 2021 o ciclo de aperto na política monetária como forma de debelar a inflação no Brasil. Desde as primeiras rodadas de elevação da taxa básica de juros, diversos economistas já apontavam que tal ação seria inócua para dirimir a inflação que tinha como causa, sobretudo, a desvalorização cambial; a desorganização das cadeias de fornecimento global e, mais tarde, os choques nos preços administrados, sobretudo energia e combustíveis.

A prova cabal é que os sucessivos aumentos na taxa básica de juros foram acompanhados pari passu com sucessivos aumentos na inflação, chegando no momento atual em que tanto inflação quanto juros básicos acumulam, os dois, níveis de dois dígitos.

Se pouco eficiente para o combate de uma inflação que não decorre de aquecimento na demanda agregada, o expediente de aumentos contínuos na taxa Selic causa, por outro lado, problemas no lado fiscal da economia, que – na visão dos mesmos que apregoam choque de juros – exigirão ainda mais juros, posto que o desequilíbrio fiscal também seria um causador da inflação ou um elemento de pressão sobre os juros para o financiamento da dívida pública.

Nessas horas, misteriosamente, o problema fiscal passa a segundo plano. Assim, esquecem-se das restrições orçamentárias e da dívida pública quando o seu aumento é decorrente de encargo financeiro, ficando a mesma em evidência – unicamente – quando trata-se de aumento de gastos sociais.

É bom lembrar, no entanto, que cada ponto percentual de aumento na taxa Selic logra impactos substanciais no rolamento da dívida pública, que é quase na sua totalidade atrelada a essa taxa. Segundo reportagem recente do site Uol, a passagem de uma Selic de 9,25% para 12,75% ao ano aumentou a dívida pública em R$ 117 bilhões em 12 meses. Somente esse gasto extra – que em parte vai ser pago com receita financeira, mas outra parte sairá das receitas tributárias – corresponde a 31% de todo o orçamento do Auxílio Brasil para o ano de 2022.

Ainda que parte da dívida seja paga com mais endividamento, ou seja, que seja paga com receita financeira, esses novos papéis serão lançados com juros maiores do que aqueles que eles amortizarão e o pagamento dos seus juros irão disputar os demais recursos públicos, sendo um verdadeiro sistema de transferência de renda às avessas.

Por fim, não apenas o aumento da taxa básica de juros transfere renda aos mais ricos, mas – sobretudo – ele atua como um desestímulo ao crescimento econômico, inibindo investimentos e consumo que, por sua vez, freiam o dinamismo do mercado interno, travam a geração e, por consequência, o nível de renda.



Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.

Juliane Furno

É Professora na Faculdade de Economia UERJ. Foi Economista-Chefe do IREE. Cientista social, mestre e doutora em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Economia da Unicamp. Especialista em mercado de trabalho, desenvolvimento econômico e política industrial no setor de Petróleo e Gás.

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