Os fatos mais recentes sobre o desenvolvimento da inteligência artificial apontam para um movimento disruptivo.
Definitivamente 2023 será o ano da inteligência artificial (IA). A presença diária de notícias que tratam sobre o desenvolvimento e a presença da IA em nossas vidas confirma essa tendência, num debate que sofreu uma rápida escalada, onde prevalece a polarização e o acirramento de posições pró e contra, com alguns movimentos recentes chamando a atenção da comunidade global, como a proibição do ChatGPT na Itália no começo deste mês.
Do lado dos desenvolvedores e dos usuários pioneiros, a ferramenta foi pensada e desenvolvida para ser capaz de facilitar nossa rotina, otimizar tempo e construir decisões informadas em grandes fontes de dados e orientadas por algoritmos dirigidos para fins específicos, com potencial de mudar totalmente a forma de decisão tanto no plano corporativo-empresarial como nos trabalhos pessoais, transformando profundamente o mundo digital com conhecemos hoje.
Um agricultor já pode construir, com base na coleta de dados de sua área de plantio, um conjunto de decisões sobre irrigação, fertilização e semeadura de maneira adequada a cada parcela da área em questão, reduzindo custos em bases superiores a 50%. Um programador poderá obter apoio inestimável na construção de programas de computador reduzindo centenas de horas de trabalho. Empresas poderão padronizar mensagens e mecanismos de marketing com uso intenso de dados e inteligência na obtenção de respostas e resultados. Poderão incrementar seus setores de compra e venda de maneira a queimar muitas etapas dos processos atuais. Sistemas de governo poderão padronizar instrumentos de atendimento e respostas de maneira a facilitar imensamente a vida dos cidadãos. Num plano mais pessoal, você poderá transformar sua tela de computador num porta retrato digital com simples comando de voz ou obter um texto de 2.000 palavras sobre Santos Dumont, sobre questões de química ou qualquer outro assunto que lhe interesse.
Mas é na medicina que a IA parece se tornar mais impactante. O Watson, um supercomputador da IBM, construído a partir da reunião de milhões de dados e de textos acadêmicos especializados, tornou-se recurso valioso para o setor de oncologia a nível mundial. Outro supercomputador inglês, o Deep Mind, da Google, reuniu dados de 1,6 milhão de pacientes e, em trabalho sobre melanoma, mostrou ter melhor desempenho diagnóstico que especialistas da área (76% x 70,5% de acertos). Outro exemplo é o EyePacs da IBM, que atingiu precisão de 86% no diagnóstico e classificação da retinopatia diabética, doença que leva a cegueira.
Em contrapartida, se levantam fortes argumentos que preveem que não haverá final feliz nesta história. E são argumentos e autores de grande prestígio e respeito, que alegam os perigos inerentes ao ato de entregarmos às maquinas a nossa capacidade particular de criação, de raciocínio e de construção social, dentro de padrões contratuais e éticos erigidos durante séculos de duros embates e sofridos processos de entendimentos.
Os principais agentes e investidores do setor, preocupados com tais questionamentos, têm instituído diversos mecanismos de proteção ao processo de desenvolvimento dos instrumentos de IA, acreditando que podem contornar os reais problemas de erros que as máquinas podem cometer.
Hoje, apesar do cenário econômico não estar favorável ao mundo das startups, a área específica de inteligência artificial não parece se deprimir. Num passado recente, alguns players focados em IA conseguiram aportes bilionários para seus desenvolvimentos, como o caso da OpenAI. A empresa é uma startup de tecnologia norte-americana fundada em 2016 por Sam Altman, um empreendedor de 37 anos nascido em Chicago, Illinois. No verão de 2019, após vários meses de negociação com a gigante Microsoft, ele recebeu o sinal positivo para um aporte de USD 1 bilhão para desenvolvimento tecnológico. O recurso foi destinado a companhia para construir o que foi chamado de artificial general intelligence (A.G.I.), um sistema que possa fazer qualquer coisa que o cérebro humano é capaz de fazer.
De acordo com uma recente publicação do jornal New York Times (NYT), Sam Altman acreditava que A.G.I. traria ao mundo prosperidade como ninguém jamais havia visto. Mas não deixava de admitir também que o processo de desenvolvimento cometesse falhas, espalhando desinformação, prejudicando o mercado de trabalho ou mesmo colocando em risco instituições importantes de nosso cotidiano.
Recentemente a empresa OpenAI lançou no mercado um chatbot online chamado ChatGPT, onde qualquer pessoa que possua conexão com à internet está a um clique de distância desta nova tecnologia, podendo experimentar livremente os benefícios já disponíveis na plataforma, que demonstra uma habilidade que parece ser humana.
E foi exatamente o lançamento do ChatGPT que inflamou o debate sobre os ganhos, perdas, benefícios e riscos da IA. Isso porque logo ficou claro que, com a mesma eficácia que o ChatGPT resolve questões abstratas e complexas, também pode espalhar fake news com consistentes argumentos e até mesmo persuadir pessoas a fazer coisas que não deveriam. Neste cenário, ganhou destaque na mídia a foto do ex-presidente Donald Trump preso e do Papa com um agasalho branco moderno, criadas pela inteligência artificial e que, num primeiro momento, pela excelente qualidade de execução, aparentavam ser verdadeiras.
Segundo um artigo publicado no NYT na semana passada, mais de mil especialistas em IA e líderes globais de tecnologia pediram à OpenAI e outras empresas do ramo que parem de trabalhar em sistemas como o ChatGPT, dizendo que eles apresentam “riscos profundos para a sociedade e a humanidade”. Mas muitos líderes da indústria tech, pesquisadores e especialista em IA veem o ChatGPT como uma mudança tecnológica fundamental, tão significativa quanto a criação do navegador web ou do Iphone.
Sam Altman, na figura de CEO da companhia, de alguma forma procura incorporar cada uma dessas visões antagônicas, na esperança de equilibrar as inúmeras possibilidades enquanto move essa tecnologia estranha, poderosa e defeituosa para o futuro. Hoje ele vem recebendo críticas de todas as direções, mas pessoas próximas a ele acreditam que é assim que deve ser. Segundo o presidente da OpenAI, Greg Brockman, “se você está incomodando igualmente os dois extremos, então está fazendo algo certo”.
Pelas entrevistas recentes de Sam Altman e dos principais players do setor, fica nítido que o Vale do Silício vai seguir adiante com todas as suas forças financeiras e estratégicas para alavancar esta tecnologia mesmo não tendo total segurança sobre suas implicações. Eles acreditam que a inteligência artificial vai acontecer de um jeito ou de outro e que ela será capaz de fazer coisas maravilhosas que nem mesmo seus atuais desenvolvedores são capazes de imaginar. Afirmam que, ao longo desta jornada, serão encontradas formas de suprimir as dores que esta nova tecnologia pode causar. Eles insistem que foi assim em todos os momentos disruptivos de nossa história e que, ao longo do tempo, o desenvolvimento de novos e revolucionários instrumentos de conhecimento e de trabalho tendem a trazer muito mais benefícios do que perdas para o conjunto da sociedade.
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Yasser Hatia
Empresário, graduado em administração de empresas pela FGV e aluno no curso de mestrado profissional em gestão com foco em varejo pela FGV. Iniciou sua carreira no mercado financeiro atuando na área de fusões e aquisições. Atualmente exerce atividade profissional no segmento de varejo e serviço.