Estratégias sistêmicas para a infraestrutura brasileira

Maestros arquitetam e regem os movimentos estratégicos de diversos componentes envolvidos em uma orquestra. Essa analogia é o ponto de partida para a construção de um diálogo sistêmico sobre infraestrutura, explorando as interfaces e dinâmicas entre o setores público e privado.

por | 19 abr, 2021 | Coluna

IREE INFRA

Infraestrutura está diretamente relacionada ao desenvolvimento econômico e social de qualquer nação, no entanto, apesar de evidências sobre tal fato, diversos países continuam a sofrer pelo tamanho da lacuna de infraestrutura e falta de investimentos em seus sistemas nacionais. Os setores de energia e transportes concentram grande parte dos investimentos, porém projetos de saneamento básico são igualmente críticos para países em desenvolvimento que almejam avançar em um crescimento sustentável.

Em um cenário onde infraestrutura possui tamanho poder estratégico, a natural consequência é o forte interesse de governos no desenvolvimeto de mecanismos para avançar o provimento de ativos para suas respectivas populações. No entanto, muitas vezes o foco do debate concentra-se somente no provimento do ativo físico, deixando em segundo plano a visão estratégica de longo prazo de tais investimentos, os quais impulsionam diversos indicadores de desenvolvimento. Nesse contexto, importantes pilares contemporâneos na discussão de infraestrutura incluem o aumento exponencial da digitalização e estratégias de adaptação em função das mudanças climáticas.

Considerando o cenário global de demandas em infraestrutura, não há capacidade e condições estruturais para o desenvolvimento de tais projetos somente com recursos públicos. Diversos países possuem desafios para o alocamento de recursos em infraestrutura, em função do alto gasto com outras prioridades, muitas vezes obrigatórias. O investimento público em infraestrutura encontra-se, consistentemente, abaixo do recomendado pelas práticas internacionais para fomentar o desenvolvimento. Desta forma, o estado passa a abrir o mercado para investimentos privados através de diversas modalidades, explorando cadeias de valor nacionais e globais.

É preciso, portanto, uma articulação com o setor privado para o atendimento em escala dos projetos de infraestrutura. A palavra chave é escala. Escala de investimentos, projetos e consequentemente desenvolvimento nacional. Este é o ponto onde o estado passa a atuar como um maestro na criação de um mapa estratégico de longo prazo, agindo com uma visibilidade única das interdependências de diversos setores industriais e suas cadeias de valor.

O maestro público possui a consolidação e visibilidade necessárias para arquitetar conectividades entre diversos setores industriais, consolidando demandas, criando sinergias, atingindo economias de escala e benefícios para o país como um sistema produtivo integrado. A integração é de fundamental importância para diversos indicadores produtivos e percepções internacionais, sendo o risco Brasil o mais proeminente, onde ressalta-se continuamente os gargalos logísticos do país.
Grandes projetos de infrasestrutura em geral tornam-se visíveis quando entram em fase de construção, no entanto o planejamento e complexidades de fases anteriores ficam muitas vezes em um segundo plano de importância. Engana-se, portanto, quem acredita que o maestro público deve agir somente nas partes visíveis da infraestrutura, muitas vezes a alteração do marco regulatório funciona como ação ‘invisível’ para destravar e fomentar investimentos. Esse ponto é principalmente enfatizado em relação a percepção brasileira perante investidores internacionais, visto que a segurança regulatória possui forte peso em decisões corporativas para participar das oportunidades estratégicas fomentadas pelo poder público.

Desta forma, o planejamento, estruturação e iniciação de projetos no chamado front-end, são de importância crítica e estratégica para as fases posteriores. As causas de insucesso de grandes projetos muitas vezes são conectadas com desafios associados a diversos atores no front-end, as quais possuem potencial de impactar significativamente o projeto ao longo de todo ciclo de vida.

Além dos ativos de infraestrutura, é necessário avançar o debate na questão de mensuração dos benefícios sociais de tais projetos. Muitas vezes o debate fica superficial às métricas tradicionais de desempenho dos projetos (e.g. prazo, custo, qualidade), com os benefícios sistêmicos de tais projetos negligenciados. Do ponto de vista público, governos pensando em desenvolvimento de suas nações estão avançando na consideração estratégica dos benefícios de longo prazo e impactos gerados para a sociedade.

Considerando a escala do desafio, o desenvolvimento de talentos em infraestrutura é um importante vetor do crescimento industrial para o futuro. Talentos são peças raras e críticas nessa orquestra, onde a fomentação estratégica do capital intelectual é uma das grandes dimensões competitivas entre os grandes atores e suas cadeias de valor. Fomentação, desenvolvimento e retenção estão alinhados ao aumento da produtividade.

Portanto, a criação de mecanismos para fomentar o entendimento dessa dinâmica produtiva é fundamental para o debate entre os atores envolvidos em infraestrutura do mercado brasileiro e internacional. O IREE INFRA tem o objetivo de contribuir para o avanço da infraestrutura brasileira ao promover uma plataforma para eventos, diálogos e pesquisas.

Debater estratégias para infrasestrutura é pensar no futuro sustentável do Brasil, criando as fundações sistmêmicas necessárias para o desenvolvimento econômico e social.

por: iree.org.br/infra/

Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE INFRA e são de responsabilidade exclusiva dos autores.

Juliano Denicol é professor de Gestão de Projetos na University College London (UCL), e doutor em Gestão de Megaprojetos pela UCL. Atua como Global Head do grupo de megaprojetos da International Project Management Association (IPMA), coordenando uma plataforma global com mais de 70 países para o avanço do conhecimento em gestão de megaprojetos. Atuou como consultor de gestão da cadeia de suprimentos no High Speed 2, atualmente o maior projeto de infraestrutura da Europa, e como consultor de políticas de contratações públicas da European Commission. Juliano é co-investigador do Project X, um grande projeto de pesquisa com o objetivo de melhorar a gestão de grandes projetos no Reino Unido, estabelecido por nove universidades em colaboração com a agência Infrastructure and Projects Authority (IPA). Sua pesquisa em gestão de megaprojetos tem sido considerada como de alto impacto global, recebendo prêmios de pesquisa do Project Management Institute (PMI), Major Projects Association (MPA), e IPMA. A análise inclui diversos megaprojetos do Reino Unido: High Speed 1, Heathrow Airport Terminal 5, London 2012 Olympics, Crossrail, Thames Tideway Tunnel, e High Speed 2. Juliano foi reconhecido em 2019 com o prestigioso Global Young Researcher Award, concedido anualmente pela IPMA a um pequisador de gestão de projetos no mundo. No mesmo ano, recebeu o Best Reviewer Award do grupo de gestão de projetos da European Academy of Management (EURAM). Liderou a publicação de duas revisões sobre grandes projetos: o Compêndio de Grandes Projetos de Infraestrutura para a European Commission, analizando os processos de contratação em mais de 80 projetos; e uma revisão sistemática da literatura sobre a performance de megaprojetos para o PMI, onde mais de 6,000 artigos foram analizados para a identificação de causas e soluções.

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