Gil 81 Anos: Tempo Rei – IREE

Análises e Editorial

Gil 81 Anos: Tempo Rei

Gilberto Gil no último dia 26 de Junho comemorou 81 anos de vida e 50 de uma carreira que em muitos aspectos confunde-se com grande parte da história do próprio Brasil. Um exemplo é que seu bisavô, um homem chamado José, foi um escravizado que comprou a sua própria liberdade anos antes à abolição oficial da escravatura em 1888.

Seu nome “Gilberto” herdou de uma amizade que o pai, José Gil Moreira, cultivou na infância e na memória. Já o violão da casa era da irmã Gildina. Mas tempos depois, em um almoço de família em que foi impactado por “Chega de Saudade” por João Gilberto soando baixinho no rádio, pediu insistentemente à mãe o instrumento desejado, com o qual um dia mudaria os caminhos da música brasileira.

A música cresceu na vida do pequeno Gil sendo muito incentivado pela mãe Claudina Passos. O acordeão, presente desse laço materno, trilhava colocar o filho nos caminhos daquela que foi a maior de suas influências quando ainda era criança, Luiz Gonzaga. Mais tarde, em seu aniversário de 73 anos de idade, Gonzagão recebeu Gil em sua casa, e esse encontro magistral rendeu ao convidado uma bela homenagem em forma de música, a canção “Treze de dezembro”.

Em Salvador, Gil conheceu Caetano, Bethânia, Gal, Tom Zé e ainda garoto saindo de ituaçu, sua cidade natal, conheceu também o racismo na sua forma mais desavergonhada. Estranhas ironias de um Brasil confuso, foi um professor das escolas da classe média de salvador quem ofendeu Gil, oprimido por exercer pensamento crítico em sala de aula.

Outro grande amigo, Chico Buarque, conheceu ainda na sua fase seresteira em Salvador. Em uma dessas noites de muita música nas ruas do pelourinho, Gil, o seresteiro, reconheceu entre um pequeno público o autor de Roda Viva. Em um futuro mais sombrio, juntos, comporiam um dos maiores cantos brasileiros contra a repressão da ditadura militar, a música Cálice composta em 1973 e só liberada a gravação em 1978, quando foi gravada por Milton Nascimento e Chico Buarque no seu disco homônimo.

Foi em 1968 quando estava preso junto com Caetano Veloso, que Gil compôs “Cérebro Eletrônico” em um violão emprestado por um militar. Quando deixaram o cárcere e meses depois os militares exigiram o exílio dos jovens baianos, foi na casa da mãe de Gal, Mariah Costa, que Gil compôs um de seus temas mais cantados em todo o Brasil, Aquele Abraço, cujo tom de saudade é marcado pelo sentimento contido nas coisas as quais o compositor se despede.

O exílio deu para Gil uma influência sonora mais cosmopolita, colhendo inspiração no Rock inglês que vivenciou no auge dos festivais londrinos, no reggae jamaicano tendo a frente a figura do ídolo Bob Marley, e no pop americano de figuras como Prince ou Michael Jackson. Unido ao seu agudo senso das raízes brasileiras, discos como Expresso 2222 e Cidade de Salvador, ambos lançados respectivamente em 1972 e 1973, atestam essa busca incansável e criadora da música brasileira que devora parte da cultura do mundo para reinventar a sua própria.

Nos anos 1980 Gil pensava ter secado a fonte por onde jorrava a sua já vasta e diversificada obra musical. Como despedida foi composta “Palco”, uma declaração de amor inspiradora sobre o terreno que o consagrou, e que o compositor declararia ser uma de suas músicas prediletas. O mais curioso é que Gil abandonou a ideia de desistir da carreira por influência da mesma música composta para o fim dela. Assim conseguiu demonstrar ao mundo – e para nós, com a sorte de compartilharmos o ser brasileiro – um poder real de cura que suas composições emanam.

Gil se dedica firmemente a levar a cultura brasileira para os lugares mais diversos do próprio país. Os “Pontos de Cultura”, são um exemplo. O projeto que desenvolveu como Ministro no primeiro mandato do presidente Lula, é parte fundamental no incentivo à dinâmica artística profissional nas periferias brasileiras até hoje.

O caráter multifacetário da vida e da obra musical de Gilberto Gil, corresponde à multiplicidade cultural formadora do próprio Brasil, aproximando assim a sua música, da voz do povo brasileiro.



Por Diego Jandira

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