O noticiário político tem relacionado o ritmo de liberação de valores de emendas parlamentares à busca de apoio do governo na votação de seus projetos. Matéria do Valor destacou que “Lula empenha em maio R$1,3 bi em emendas para agradar base”. Já o site Poder 360 mostrou que o governo federal acelerou o ritmo de empenho de emendas em julho, mês de negociações da reforma tributária.
As emendas sempre serviram de instrumento de negociação entre os Poderes Executivo e Legislativo, com certa vantagem do Executivo nessa relação. No entanto, o controle do Congresso sobre o orçamento tem crescido desde a criação das emendas impositivas em 2015. Se por um lado essas emendas reduzem o poder de barganha do Executivo, o aumento das verbas direcionadas a elas prejudica a execução de políticas públicas, de acordo com o planejamento do governo, enfraquecendo as diretrizes dos Ministérios.
Como funciona o Orçamento Público
Os gastos dos governos são definidos por lei. O Poder Executivo elabora os Projetos de Lei do Orçamento, que são a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a qual aponta as prioridades do governo para o próximo ano, e a Lei Orçamentária Anual (LOA), que tem todos os gastos detalhados.
Esses projetos de lei são enviados ao Congresso Nacional para análise e aprovação. O Poder Legislativo então discute, propõe emendas, aprova as propostas e julga as contas do Executivo. Senadores e Deputados Federais propõem modificações por meio das emendas, que podem ser individuais, de bancadas ou setoriais. As emendas parlamentares podem acrescentar, suprimir ou modificar itens do orçamento.
As emendas parlamentares
As emendas são uma forma de estados e municípios, representados por seus parlamentares, conseguirem determinadas verbas do Orçamento de maneira mais eficiente, mas não eram garantidas. Até 2015, o governo federal podia definir se os recursos para as emendas seriam liberados e quando. Isso permitia ao governo utilizar as emendas como meio de negociação, por meio da liberação de recursos em momentos estratégicos para obter apoio dos parlamentares em votações, por exemplo.
Insatisfeitos com essa relação, os parlamentares conseguiram aprovar em março de 2015, início do segundo mandato de Dilma Rousseff, a Emenda Constitucional 86, que tornou obrigatória a execução das emendas individuais, limitadas a 1,2% da receita corrente líquida do ano anterior. Foi mantido, porém, o poder do governo federal de ditar o ritmo da liberação dos recursos.
Em 2019, primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, quando não era clara a sua base partidária de apoio, outras mudanças importantes aconteceram. A obrigatoriedade de execução foi estendida às emendas de bancadas estaduais, e foi criada a modalidade de transferência especial, a chamada “emenda pix”, para acelerar o repasse a estados e municípios, sem a necessidade de um projeto. Essa modalidade tem recebido críticas pela dificuldade de rastrear a finalidade do dinheiro.
Orçamento Secreto
Foi em 2019 também que foi criada a polêmica Emenda de Relator, declarada inconstitucional pelo STF em dezembro de 2022, pela falta de transparência. A Emenda de Relator não era impositiva, e ficou conhecida como Orçamento Secreto por não apresentar o nome de quem solicitou, nem a destinação das verbas.
Na prática, esse tipo de emenda permitiu que mais uma parte significativa das verbas federais fossem administradas por deputados e senadores. E não demorou muito tempo para que denúncias de corrupção começassem a aparecer, incluindo superfaturamentos nas compras de tratores e máquinas agrícolas, caminhões de lixo, ambulâncias, entre outros casos.
Com a proibição do Orçamento Secreto pelo STF, os parlamentares incluíram na PEC da Transição, lei que elevou o limite do Teto de Gastos, em 2023 para viabilizar investimentos do novo governo Lula, um dispositivo que transferiu metade do valor das emendas de relator para as emendas individuais. O dispositivo também aumentou o valor mínimo de execução obrigatória para 2%.
Situação atual
Como resultado de todas essas mudanças, de 2015 a 2023, o valor das emendas impositivas saltou de R$ 9,7 bilhões para R$ 28,9 bilhões. Segundo estudo recente elaborado pelo professor do Insper Marcos Mendes, o Legislativo brasileiro é o que tem o maior controle sobre o orçamento federal, se comparado a 30 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Há R$ 36,5 bilhões destinados no Orçamento de 2023 para emendas, mas até abril, o governo Lula praticamente não havia reservado valores para desembolso, o que gerou descontentamento dos parlamentares, e uma crise aberta com o Presidente da Câmara, Arthur Lira. Desde então, já foram empenhados R$ 17,7 bilhões, dos quais 10 bilhões apenas em julho.
Por Samantha Maia
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