Degradação ambiental brasileira de mãos dadas com a econômica – IREE

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Degradação ambiental brasileira de mãos dadas com a econômica

Loreta Guerra

Loreta Guerra
Graduanda em Economia da FGV e em Ciências Sociais na FFLCH-USP



Nas últimas décadas, a destruição ambiental entrou cada vez mais no debate público. Há algumas repercussões amplamente discutidas, como o derretimento das calotas polares ou os buracos na camada de ozônio. Seu reconhecimento, contudo, é pequeno, dado que, por mais graves que sejam, podem não soar tão tangíveis e ameaçadoras para ouvidos leigos.

A situação parece estar se revertendo: progressivamente os impactos da destruição ambiental sobre o cotidiano das sociedades são mais perceptíveis, em especial diante das mudanças climáticas. A economia está dentro do vasto conjunto de setores perturbados pelos fenômenos ambientais. No Brasil, a seca e a exagerada variação térmica lideram esse papel.

Recentemente, a população de Ribeirão Preto, no interior do Estado de São Paulo, assustou-se com uma tempestade de areia anterior à chuva, o que ocorre quando a precipitação encontra um solo muito seco. A região afetada apresenta realmente um índice de seca elevado nos últimos tempos.

Apesar da maior visibilidade que recentes eventos como esse trouxeram para a questão ambiental nacional, foca-se bastante nas implicações sobre a saúde da fauna, flora e da própria população brasileira. Por sua imensa importância é que devem estar no centro do debate ambiental, ressaltando-se a evidente existência dos impactos econômicos provocados pelas mudanças climáticas. Além de influenciarem importantes setores da produção, com destaque para a agroindústria, os efeitos se dão de maneiras desiguais pelo território brasileiro, sendo o Nordeste a principal região afetada.

O aquecimento global, a variação exagerada entre calor e frio, o clima mais seco e a poluição formam uma péssima combinação para certas culturas, dentre elas a soja. Nesse cenário, o risco climático aumenta e, para se desviar dele, são necessárias medidas custosas, como a aquisição do seguro rural do Ministério da Agricultura. É um item que eleva as despesas com a atividade agrícola, causando não só perdas para o mercado doméstico e comércio brasileiros, mas também para a subsistência de muitos grupos que dependem da agricultura para sobreviver – e não possuem os meios para se “blindar” do alto risco. O seguro rural, ainda, não pode cobrir a todos, pois é limitado. Dos R$ 924 milhões disponibilizados em 2021, 800 milhões já foram utilizados, indicando uma incerteza profunda dos produtores, especialmente se considerada a seca intensa hoje vivida no país.

As condições climáticas desfavoráveis pressionam a inflação, afetando o preço dos alimentos. O IGP-DI da FGV indicou alta de 1,45% em julho e uma queda leve de 0,14% em agosto. Considerando os resultados até agosto, o acumulado do ano foi de 15,75%, acima do acumulado até o mesmo mês no ano passado (11,11%). Esse índice pondera três importantes medidas de preço (IPA, IPC e INCC) de 7 grandes cidades do Nordeste, Sudeste e Sul. Tais dados são de especial importância para a análise do setor alimentício e outros derivados da produção agrícola. O aumento do IGP-DI reflete, portanto, o problema de oferta de commodities agrícolas, hoje atribuído a eventos climáticos.

A crise hídrica também é um resultado do período de seca anormal pelo qual passamos atualmente. Com a falta de chuvas, os reservatórios das hidrelétricas estão vazios. Segundo o Operador Nacional do Sistema (ONS), ao final de setembro o volume útil da represa de Furnas é de 13,96% – extremamente baixo em comparação com anos anteriores – sendo que sua hidrelétrica alimenta cerca de 20% do subsistema Sudeste/Centro-Oeste. Nesse cenário, a produção de energia térmica, solar e eólica está em alta (apesar do seguido domínio da energia hidrelétrica), o que encarece as contas de luz.

A população, assim, sofre por diversas vias que vão além do escopo das complicações estritamente ambientais ou de saúde decorrentes das alterações no clima. Um índice interessante explora um pouco mais esses impactos socioeconômicos. O Global Climate Risk Index é construído pela ONG alemã Germanwatch, que colhe dados sobre degradação ambiental desde os anos 90. É feito um ranking dos países analisados de acordo com a intensidade da repercussão de eventos climáticos extremos. As posições são determinadas a partir de uma ponderação das fatalidades diretas e perdas econômicas provocadas (paridade do poder de compra em US$ – PPC e porcentagem do PIB). Quanto mais acima se está no ranking, mais negativamente impactado é o país. De acordo com os últimos relatórios lançados, no período acumulado de 1999 a 2018 o Brasil ocupou o 88º lugar. Em 2017, ficou em 79º e, apresentando uma melhora, pulou para 91º em 2018. Contudo, conforme a pesquisa lançada neste ano, em 2019 a situação parece ter regredido exponencialmente, já que o país saltou para a 27ª posição, o que indica a péssima classificação brasileira.

Fica cada vez mais claro o quanto a degradação do meio ambiente afeta negativamente a vida em sociedade. As mudanças climáticas são expressões nítidas desse fato, aumentando a atenção dada à questão ambiental ao retirá-la de um plano teórico para a realidade. Diferentemente do que se pode pensar, não são o aumento das ondas de calor ou a imprevisibilidade da amplitude térmica suas únicas implicações.

As mudanças climáticas têm poder para influenciar a economia, sobretudo no que toca ao custo de vida da população. Especialmente no Brasil, um país que tanto explora a agricultura para o mercado doméstico e exterior, além de uma relativa dependência dos recursos hídricos na produção de energia, esse fato merece atenção. A seca e a poluição, dentre tantas outras transformações recentemente intensificadas, são motivo de preocupação por si próprias. Mas também, e com absoluta certeza, são por demais sensíveis para a economia.



Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.

Loreta Guerra

É graduanda em Economia na Escola de Economia de São Paulo (EESP) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e em Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Participou em 2020 de um estudo sobre os impactos da Lei Maria da Penha com o grupo de Jurimetria da USP e é redatora da revista estudantil da FGV Gazeta Vargas desde 2019.

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