Existe um conceito nos estudos de política internacional conhecido como Diplomacia de Cúpula (ou Diplomacia Presidencial) – esse conceito é aplicado num contexto onde o Líder de Estado (Presidente) de um determinado país (Estado) resolve fazer “diplomacia com as próprias mãos”. Em tese, nos conceitos clássicos da diplomacia, o responsável por garantir as relações exteriores de um determinado Estado é o seu corpo diplomático – no caso do Brasil, esse corpo é o Itamaraty.
Nessa última semana, vimos a aplicação da teoria na prática de uma maneira extraordinária. E mesmo os que não estão familiarizados com esse contexto dificilmente conseguirão esquecê-lo.
Os presidentes dos dois países mais poderosos do mundo (sim, a Guerra Fria não acabou) – Rússia e Estados Unidos – apertaram as mãos e discutiram assuntos que acima de tudo abalaram as instituições políticas americanas e colocaram em cheque a estrutura de segurança eleitoral do país. Trump fez comentários que desmoralizaram a força policial mais importante dos Estados Unidos, e quiçá do mundo, o FBI. Ele ainda alfinetou a União Europeia, e exaltou a inocência de um líder estrangeiro no que se diz referente as interferências nas eleições americanas de 2016.
Realmente, Trump é a prova de que não se dá para fazer justiça (ops, diplomacia) com as próprias mãos.
Em linhas gerais, quando um presidente decide tomar a frente dos assuntos diplomáticos do seu país, o resultado quase sempre é desastroso. Por aqui, durante um período da história democrática brasileira, a diplomacia de Cúpula pareceu ser a regra de conduta diplomática. O auge desse período foi ilustrado pelo aperto de mão entre Lula e o presidente Ahmadinejad (na época presidente do Irã, com posições bastante radicais contra os Direitos Humanos) – um evento que muitos apontam como desmoralizante para o corpo diplomático brasileiro.
A grande questão aqui parece ser: até onde e quando o corpo diplomático de um país possui autonomia em relação ao governo que serve?
Num mundo cada vez mais multilateral – onde órgãos independentes como empresas e organizações internacionais possuem mais autonomia – os tradicionais corpos diplomáticos parecem estar entrando no ostracismo e perdendo parte do destaque que tinham na época do nosso ilustre Barão do Rio Branco, cuja a principal função era garantir a soberania das nossas fronteiras e incorporar novos territórios.
Pois bem, chego a um ponto de reflexão onde me pergunto – onde estão os corpos diplomáticos durante crises como Trump/Putin para garantir o resguardo das instituições dos países aos quais eles servem? Seriam eles ainda necessários para a garantia das boas relações de conduta entre os países?
O Itamaraty, infelizmente, parece se enquadrar no cenário de coadjuvante diplomático. Somos apontados como um dos serviços mais respeitados do mundo, porém, desde os governos Dilma e agora Temer, os nossos diplomatas estão sem espaço e apoio para atuarem mundo afora defendendo os interesses políticos e comerciais brasileiros. O Itamaraty é engessado pela burocracia e isso atrapalha a desenvoltura de um corpo diplomático mais independenete e pró-ativo. O Brasil está em recessão econômica e crise existencial, não existe uma estratégia politica consistente e muito menos internacional. Isso impacta diretamente o Itamaraty, que também viu seus fundos serem cortados pela metade desde 2011.
O conceito de diplomacia clássico está em crise, porém, não podemos esquecer que a base para o mundo global que vivemos veio de diplomatas esforçados que atuavam em prol da soberania de seus países garantindo a legitimidade de seus governantes – é importante lembrar e enfatizar que para um país se consagrar como potência mundial ele precisa de um corpo diplomático estruturado, profissional e com certa autonomia para poder dizer não a politicas tolas e bobas que ridicularizam suas composições políticas.
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