Coronavírus: O Brasil está preparado para lidar com a pandemia? – IREE

Análises e Editorial

Coronavírus: O Brasil está preparado para lidar com a pandemia?

A rápida expansão do coronavírus pelo mundo configura uma pandemia, segundo declarou a Organização Mundial de Saúde (OMS) no último dia 11 de março. No momento da declaração, já eram contabilizados mais de 118 mil casos em 114 países e pelo menos 4.291 mortes registradas. 

Apesar da letalidade parecer baixa, entre 0,5% e 3,5% dos infectados, e de 80% das pessoas infectadas desenvolverem apenas casos leves da doença, é importante não se enganar sobre a gravidade da situação. Sem medidas de controle de transmissão da doença, o número de pessoas infectadas tende a subir muito rapidamente. 

Em grupos de maior risco, como idosos, diabéticos e com doença no coração, a letalidade sobe para até 18%, e trata-se de uma doença que causa 65 vezes mais hospitalização do que a gripe mais comum. Se o pico da epidemia acontecer de forma muito rápida, pode haver colapso do sistema de saúde, como é visto na Itália, por exemplo. 

O país europeu enfrenta superlotação nos hospitais e falta de médicos e enfermeiros. A situação fez com que aumentasse o número de mortes por Covid-19, doença provocada pelo coronavírus, e trouxe outros impactos, como o congestionamento do serviço funerário, que demanda ação especializada por causa da possibilidade de contágio. 

Por isso, a orientação da OMS é que os países atuem para conter a velocidade de transmissão da doença, agindo rapidamente para detectar, testar, tratar, isolar e rastrear os casos. A lógica é retardar o máximo possível a dispersão do vírus e assim permitir um atendimento adequado a quem necessitar. Não é o que o Brasil tem feito. 

No dia 10 de março, o presidente Jair Bolsonaro disse em discurso em Miami que a “questão do coronavírus” não era “isso tudo”, e que se tratava mais de uma fantasia propagada pela mídia no mundo. Na volta da viagem, descobriu-se que o secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten, havia contraído o vírus e toda a comitiva teve que fazer teste, incluindo o presidente, a primeira-dama Michelle Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). A informação dada pelo Planalto é de que os testes deram negativo.

Em entrevista para a BBC Brasil, o virologista e professor no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP) Paolo Zanotto disse que o Brasil já perdeu um tempo precioso e que deveria agir o mais rápido possível para conter o avanço da doença no País, com medidas como investir maciçamente em testagem e isolar os infectados. 

“O problema principal é, assim, adequar a velocidade de crescimento da doença à capacidade de resposta do sistema de saúde. Se essa curva cresce exponencialmente como temos visto na Itália e no Irã, perdemos o controle. O sistema de saúde colapsa e compromete toda a sociedade”, disse Zanotto à BBC Brasil.

Até o dia 12 de março, nenhuma medida em larga escala havia sido tomada no Brasil para conter a disseminação do vírus. O aumento de casos confirmados deverá levar a uma mudança no protocolo adotado pela rede de saúde para diagnóstico da doença.

Até o momento os testes vêm sendo realizados em todas as pessoas que procuram a rede pública com sintomas característicos e que tenham histórico de viagem, mas em breve deixarão de ser aplicado em locais com mais de cem casos confirmados. 

Em São Paulo, há apenas 20 mil kits de exames laboratoriais, que serão destinados a casos de internação graves, pesquisa e na rede sentinela dos municípios do estado. Para demais casos, a confirmação da doença é apenas clínica.

Eram 77 casos confirmados de  Covid-19 no Brasil até o dia 12 de março de 2020, a maioria deles (42) no estado de São Paulo. Mas a contagem é atualizada a todo momento. 

O governo de São Paulo estima que o número de casos confirmados “vai explodir” no País a partir de agora e que dificilmente a rede de saúde vai dar conta de atender todos os casos graves. Essa informação foi passada em uma reunião científica do Instituto do Coração (InCor) sobre coronavírus e chegou ao público por meio da viralização de um áudio de Whatsapp de Fábio Jatene, diretor do Serviço de Cirurgia Torácica do InCor.

Outra informação tornada pública a partir dessa reunião é a de que o governo de São Paulo prevê que em quatro meses 45 mil pessoas serão infectadas pelo novo coronavírus na Região Metropolitana de São Paulo, das quais 10 mil precisarão de leitos em UTI.  Em coletiva, o infectologista David Uip, coordenador do Centro de Contingenciamento do Novo Coronavírus em São Paulo,  chegou a confirmar esse cálculo, mas destacou que se trata do pior cenário.

Diante desses números, parece tímido o anúncio do Ministério da Saúde de que serão direcionados 2 mil leitos de UTI para o tratamento de pacientes com Covid-19 pelo SUS. Foi anunciada também a convocação de 5 mil profissionais do Mais Médicos para ajudar no combate ao surto de coronavírus. 

Em 13 de março, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse à Folha de S.Paulo que a agenda dos próximos 45 dias seria focada no combate aos efeitos econômicos do coronavírus , mas que o ministro da Economia, Paulo Guedes, não tem quase nada para apresentar como medidas de curto prazo.

A negligência do governo federal em relação à gravidade da pandemia gera um ambiente de muita dúvida sobre o que a população deve fazer e uma perspectiva alarmante sobre os impactos que os casos de Covid-19 terão no sistema de saúde e na economia do País.



Por Samantha Maia

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