O efeito da taxa de juros na política – IREE

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O efeito da taxa de juros na política

Maria Antonia De’Carli

Maria Antonia De’Carli
Correspondente do IREE em Londres



A prova viva (e prática) de que economia e política sempre andam lado a lado (desculpem-me os não muito fãs de fórmulas macroeconômicas).

Uma prova de que economia e política são extremamente dependentes uma da outra – provavelmente uma mais que a outra, qualquer que seja a mais dependente, fica a critério de cada leitor – se tem quando os diretores do Banco Central de um país se reúnem para discutir diretrizes e medidas para o futuro das suas taxas de juros.

No Brasil, a principal taxa de juros é a SELIC, que representa a remuneração das instituições financeiras nas operações com títulos públicos e que acaba comumente sendo utilizada como um índice pelo qual as demais taxas de juros no Brasil se baseiam para suas operações (por exemplo, quando um banco faz uma hipoteca ou até mesmo empresta dinheiro a outro banco, suas taxas de correção monetária ou taxas de juros serão baseadas no índice da SELIC).

A SELIC é ajustada pelo Copom, que é o Comitê de política Monetária do Banco Central (ou BACEN na forma reduzida) – seu índice atual e de 6,5% ao ano – o que em tese significa que esse é menor índice SELIC que o Brasil teve desde 1999, quando se iniciou o regime de metas para a inflação (o grande pesadelo econômico dos países em desenvolvimento).

Apesar de domesticamente a SELIC estar abaixo da sua média, internacionalmente já não se diz o mesmo. Em termos de juros reais (a taxa de juros real é o rendimento do dinheiro descontada a inflação do período), o Brasil atinge o alto valor de 3,54% ao ano, ficando em 6º lugar no ranking de países que possuem as maiores taxas de juros reais no mundo.

Como referência, alguns dos países que estão próximos do Brasil nesse ranking quase declararam moratória recentemente, caso da Argentina, outros também estão na corrida BRICS, como a Rússia, e outros ainda são parceiros de políticas externas, como a Turquia (que reina em primeiro lugar, com uma esplendorosa taxa de 10,20% ao ano).

Pois bem, saindo um pouco da linguagem econômica e adentrando um mundo político e mais real, a escolha de falar de taxas de juros nominais neste artigo se deve aos anúncios de alterações ou manutenções nas suas taxas de juros feitos nesta semana por grandes economias, como o Japão (sua taxa é de -0,1% ao ano), Índia (4,6%), Estados Unidos (2%), Inglaterra (1,75%) e Brasil.

O cenário econômico global, apesar da guerra comercial de Trump, parece ter atingindo um certo nível de estabilidade, o que fez com que a maioria das comitivas responsáveis pelas taxas de juros de seus países mantivessem posturas conservadoras sem fazer muito malabarismo.

Por exemplo, o Federal Reserve ou FED (Banco Central Americano, que, diga-se de passagem, é uma instituição privada) anunciou a manutenção da sua taxa de juros no mesmo índice da sua última revisão (2% ao ano) – indo na contramão do que muitos analistas econômicos acreditavam. Havia de parte deles a expectativa de que a taxa fosse subir para controlar possível inflação, desregulando o crescimento econômico.

A taxa de juros é um instrumento utilizado para controle de politicas econômicas fiscais – ela é o principal mecanismo que um país pode usar para controlar a inflação. A inflação é um grande pesadelo econômico inclusive para países em desenvolvimento como o Brasil, ela “vulgariza” a moeda de um país, e a torna sem valor.

Em consequência, os preços dos bens de consumo sobem, os salários caem, o desemprego aumenta, a população fica mais pobre e as crises econômicas surgem. Quem não se lembra da década perdida no Brasil (os anos 80)? Quanto era mesmo valor da nossa moeda frente ao dólar? Garanto que isso custou a carreira política (bem nem tanto) de muitos ex-presidentes.

Portanto, taxas de juros são importantes. O mundo desenvolvido, de forma geral parece estar saindo de um cenário deflacionário crônico (exceto o Japão) e adentrando num cenário de política fiscal contracionária – ou seja, o aumento das taxas de juros sinaliza que os governantes irão enxugar gastos e os investidores não irão achar o território tão atraente para potenciais investimentos. Países como os EUA e a Inglaterra tiveram um rendimento econômico relativamente alto desde a crise de 2008.

Pelos trópicos brasileiros, a política é inversa desde que a inflação se manteve mais estável e o BACEN vem reduzindo a SELIC gradualmente. Porém, isso não significa muito, pois foi mencionado acima que o Brasil tem uma das mais altas taxas do mundo. Especialistas acreditam que o Brasil irá manter o cenário ocioso de crescimento lento e inflação devidamente sob controle. Ou seja, uma alteração brusca na SELIC apenas aconteceria se houvesse algum choque que alterasse a trajetória prospectiva e o balanço de riscos para inflação, ou inclusive um cenário eleitoral muito complicado que pode levar o Copom a promover uma elevação da taxa.

E mantemos os dedos cruzados para que isso não aconteça. Voltar 30 anos em um é o inverso do proposto por alguns dos nossos queridos ex-presidentes.



Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.

Maria Antonia De’Carli

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