Confira aqui a análise sobre Política Monetária e Política Fiscal produzida pelo Centro de Estudos de Economia do IREE, na edição semanal do Boletim Econômico de junho de 2021!
POLÍTICA MONETÁRIA
Em Junho, nosso boletim de Política Monetária tratará, em primeiro lugar, da 239ª Reunião do Copom que elevou o juro básico e apontou para mais elevações futuras. Em segundo lugar, tratamos dos recentes números divulgados do IPCA, do IGP-10 e da Inflação por Faixa de Renda elaborada pelo IPEA.
No dia 16 de Junho, ocorreu a 239ª Reunião do Comitê de Política Monetária, o Copom. Na reunião, foi tomada a decisão de se elevar a taxa básica de juros para 4.25% a.a., ou seja, em linha com o que tinha sido anunciado em sua última reunião o Copom elevou a taxa em 0.75%. O comunicado da reunião aponta para a persistência dos estímulos monetários e fiscais externos e indica uma retomada consistente da economia internacional. Ademais, o Copom também aponta que internamente “os riscos para a recuperação econômica reduziram-se significativamente” na esteira dos indicadores recentes que surpreenderam positivamente.
Um dos principais pontos do comunicado, no entanto, refere-se a uma mudança de tom frente à inflação prospectiva. Se nas últimas reuniões o comitê vinha mantendo a comunicação de que acreditava que as pressões inflacionárias vividas no país – oriundas sobretudo do aumento dos preços internacionais de commodities – eram temporárias, no atual comunicado, aponta-se para um cenário de maior persistência dos choques inflacionários, citando-se “a lentidão da normalização nas condições de oferta, a resiliência da demanda e implicações da deterioração do cenário hídrico sobre as tarifas de energia elétrica”. Dessa forma, o comitê mantém em sua comunicação a visão de que no cenário para inflação ainda persistem sinais em direções contrárias. Por um lado, ainda é possível uma reversão das altas nos preços de commodities e, por outro, a continuidade de estímulos fiscais devido a pandemia, bem como a paralisação no processo de reformas estruturais, apresentam-se como riscos altistas.
Nesse sentido, o comitê não mais fala em normalização parcial, mas sim normalização monetária, indicando novo ajuste de mesma magnitude para a próxima reunião. Na esteira dessa mudança, as expectativas de mercado têm se ajustado para uma realidade ao fim de 2021 em que a taxa básica sobe para 6.5% e para níveis mais altos em 2022. Outrossim, para além da sinalização do BCB no sentido de continuidade e possível aceleração de ritmo dos aumentos da taxa básica, há ainda a alta probabilidade de que os juros básicos nos EUA sofram dois aumentos até 2023, ou seja, nesse caso e como sinalização no curto prazo para o Brasil e demais países da América Latina, crescem as pressões por aumentos das taxas básicas de juros.
Ao mesmo tempo, não arrefecem as críticas aos possíveis efeitos que uma aceleração do passo de aumento da taxa básica pode gerar na atividade econômica. Os níveis de emprego se encontram em patamares condizentes com uma profunda crise social e aumentos da taxa básica agravam esse cenário. Assim, o Copom tem um grande desafio pela frente no sentido de saber dosar o objetivo precípuo de controle da inflação com seus novos mandatos de suavização da atividade e fomento ao pleno emprego.
Em Junho, o IGP-10 subiu 2.32% frente a um crescimento de 3.24% no mês anterior. Os três índices que compõem o IGP – o IPA, o IPC e o INCC – tiveram aumentos respectivos de 2.64%, 0.72% e 2.81% frente a 4.2%, 0.35% e 1.02% no mês anterior. Entre as maiores influências positivas, destaca-se o aumento do Minério de Ferro, cana-de-açúcar, carne bovina, café em grão e aves no âmbito do IPA; entre os componentes do IPC, as maiores influências positivas foram a tarifa de energia elétrica, a gasolina, o etanol o condomínio residencial e seguro saúde. Por fim, entre os componentes do INCC, destaca-se o crescimento de 7.17% nos preços de tubos e conexões e o preço da mão de obra, como ajudantes especializados, pedreiros e serventes.
O IPCA em maio subiu 0.83% frente ao aumento de 0.31% da taxa em Abril, tendo como principais influências positivas, ou maior impacto sobre o crescimento do índice, os grupos Habitação e Transportes, contribuindo para o índice cheio, respectivamente, com 0.28% e 0.24%. A alta no grupo Habitação se deveu sobretudo ao aumento nos preços da energia elétrica (5.37%), enquanto que no grupo Transportes destaca-se o aumento nos preços da gasolina (2.87%), do gás veicular (23.75%), do etanol (12.92%) e do óleo diesel (4.61%).
Por fim, o indicador IPEA de Inflação por Faixa de Renda de Abril nos mostra uma interrupção da tendência observada nos meses anteriores, registrando uma desaceleração dos índices de inflação. Apesar disso, mantém-se a tendência de maiores custos inflacionários para as faixas de rendas mais baixas. A inflação para as faixas de renda baixa e muito baixa tiveram crescimento respectivo de 0.42% e 0.45%, acumulando em 12 meses 7.50% e 7.71%. Já para as faixas de renda média-alta e renda alta, a inflação observada em Abril foi de 1.08% e 1.00%, acumulando em 12 meses altas de 5.85% e 5.21%.
POLÍTICA FISCAL
Em nosso Boletim de Política Fiscal de Junho, trazemos em primeiro lugar uma breve discussão sobre os riscos inerentes ao descontrole das finanças públicas. Em segundo lugar, descrevemos a abrangência dos dois principais indicadores de endividamento público e, por fim, apresentamos o recente debate sobre a melhora nesses indicadores advinda da elevação dos preços das commodities, do aumento das exportações e do consequente aumento do PIB nominal.
No Brasil dos últimos anos, como temos apontado em várias outras de nossas publicações, ganhou muita força a visão de que a questão fiscal é o ponto essencial a ser pautado no debate econômico. Na esteira dessa visão, são apontadas as diversas reformas pró-mercado e em favor da redução do tamanho do Estado como essenciais para a retomada do chamado crescimento econômico sustentado. Para os defensores desta pauta, a manutenção da estabilidade fiscal é extremamente importante, grosso modo, a partir do seguinte raciocinio: contabilmente, a dívida pública hoje deve ser igual ao valor presente dos futuros superávits primários do governo. Dessa forma, a capacidade de geração de superávits primários por parte do governo sem a utilização da emissão monetária, isto é, preservando o valor da moeda, deve ser crível pelos credores da dívida pública. Caso esta capacidade seja questionada, os credores pedirão maiores prêmios de risco ao investir em títulos públicos ou deslocarão seus recursos para outras moedas ou para ativos reais, cenários estes que podem iniciar uma espiral inflacionária.
Uma outra visão entre os economistas, a ideia de “finanças funcionais” resgatada pelos defensores da Teoria Monetária Moderna, também tem ganhado força tanto nos países desenvolvidos quanto no Brasil. Segundo essa visão, o papel da política fiscal não deve ser avaliado a partir da ideia da “estabilidade ou descontrole das finanças públicas”, mas sim a partir de seus efeitos práticos. Assim, as decisões de gasto, tributação e endividamento do Estado devem seguir basicamente dois princípios: garantir a taxa de gasto necessária à compra de toda a produção da economia e de que o governo deve emitir ou recomprar os titulos de dívida quando vê a necessidade prática de que o público detenha menos ou mais moeda. Assim, resumidamente, essa visão parte do pressuposto de que não há restrição fiscal do governo em um país que emite dívida em sua própria moeda.
Em suma, pode-se dizer que como discursos econômicos essas duas visões estão em campos opostos. Por um lado, a primeira visão ressalta o papel das restrições fiscais a partir de convenções entre o mercado. Já a ideia de finanças funcionais ressalta a inexistência de qualquer restrição fiscal enquanto houver recursos ociosos na economia. Como expediente teórico e armas de retórica, ambas possuem méritos e deméritos, entretanto, em termos de política econômica – a realpolitik na economia – a virtude se encontra na área cinzenta desse debate. Por um lado, muitas vezes a austeridade fiscal que busca adequar as contas públicas a um referencial teórico a qualquer custo produz maiores problemas em termos de atividade econômica e não é nem mesmo capaz de atingir seus objetivos de redução do endividamento público. Por outro lado, a ideia de que não existam restrições fiscais, mesmo que para a economia avançada com instituições e mercados bem consolidados, não condiz com a realidade na medida em que os credores da dívida pública tem alto poder de representação política.
Assim, ressaltamos nossa visão de que a política fiscal deve estar em seu lugar de direito, ou seja, acreditamos que em situações de calamidade como agora e mesmo em crises econômicas cíclicas seu papel deve ser ativo. Ao mesmo tempo, uma boa política fiscal deve ser guiada por regras fiscais flexíveis que consigam responder as diferentes conjunturas econômicas e não devem impor restrições ideológicas quanto ao tamanho do Estado. Essas questões devem ser pactuadas pela mediação política e não somente por regras fiscais. Dessa forma, acreditamos que cabe ao Estado o dever da transparência e à sociedade civil o direito e dever da fiscalização. Nesse sentido, apresentamos brevemente abaixo alguns indicadores de endividamento público.
Segundo o Manual de Estatísticas Fiscais de 2018 do Banco Central do Brasil (BCB), o conceito de DBGG consiste no “total dos débitos de responsabilidade do Governo Federal, dos governos estaduais e dos governos municipais, junto ao setor privado, ao setor público financeiro e ao resto do mundo”. No Brasil, no entanto, é importante destacar que esse indicador engloba também as operações compromissadas do Banco Central, expediente utilizado para a operacionalização da política monetária e que nos últimos 20 anos tomou grande expressividade a partir da política de acúmulos de Reservas Internacionais.
Já o conceito de Dívida Líquida do Setor Público (DLSP) abrange o balanço de débitos e créditos do setor público não financeiro. Em outros termos, a DLSP é definida como a soma da base monetária; do saldo da dívida interna corrigida por juros ou índices internos; da dívida interna indexada ao câmbio multiplicada pela taxa de câmbio; da dívida externa multiplicada ao câmbio; dos ativos financeiros do setor público e das reservas internacionais multiplicada pela taxa de câmbio, isto é, expressa em reais.
Posto isso, e em diálogo sobretudo com a primeira visão apontada acima, o esforço fiscal realizado em 2020 de forma a financiar – sobretudo – o auxílio emergencial e os programas de crédito e manutenção de emprego teve papel destacado nos noticiários, pois via-se a grande expansão da dívida pública e a possibilidade de o nível da relação dívida bruta – PIB atingir a marca de 100% como uma antessala ao precipício econômico. Não obstante e sem levar em conta a triste situação política e sanitária do país, em termos fiscais, essas projeções da relação dívida/PIB não se concretizaram e atualmente temos uma perspectiva de melhora significativa no indicador.
Em termos de projeções, a trajetória dinâmica do endividamento público responde a diversos fatores. Em primeiro lugar, como aponta o economista Bráulio Borges, os principais fatores que influem nessa dinâmica como % do PIB são: i) a condição inicial, ou seja, a relação Dívida/PIB no início da trajetória a ser traçada; ii) a diferença entre o montante de juros nominais pagos e o crescimento nominal do PIB e iii) o resultado primário em % do PIB. Para além desses três principais fatores, mudanças cambiais podem também interferir no indicador na medida em que elas mudam a cotação em R$ dos passivos externos, a velocidade de acúmulo de reservas internacionais também afeta o indicador na medida em que podem alterar a necessidade de títulos pelo BCB para a operacionalização da política monetária e, por fim, eventos fiscais não recorrentes como reconhecimento de dívidas passadas, por exemplo, também influem no indicador.
Segundo Manoel Pires, o padrão de recuperação atual da economia brasileira favorece a estabilidade fiscal. A recuperação firme das principais economias mundiais, o crescimento nos preços internacionais das commodities e o decorrente aumento nas exportações brasileiras atuam da seguinte maneira: por um lado, reforçam a necessidade de o Copom continuar a subida da taxa básica de juros, afetando os juros incidentes sobre a dívida pública e seu custo. Por outro lado, o aumento das exportações atuam no sentido de estimular o crescimento do PIB nominal, aumentando as receitas tributárias do governo e, portanto, melhorando a perspectiva do resultado primário e, em especial, o aumento nos preços das commodities faz com que a diferença entre o deflator implícito do PIB se descole do IPCA.
Nesse sentido, a Instituição Fiscal Independente (IFI) em seu Relatório de Acompanhamento Fiscal de Junho de 2021 atualizou suas projeções para as principais variáveis em questão. Para 2021, em seu cenário base, a IFI projetou um crescimento do PIB real e nominal, respectivamente em 4,2% e 12,6% frente às projeções em Maio de 3% e 8,8%. Para o IPCA, Deflator implícito e Juros reais respectivamente, tem-se agora 5,7% (5,1% em Maio), 8,0% (5,7% em Maio) e -0,2% (0,4% em Maio). Outrossim, a IFI atualiza sua projeção para a relação Dívida/PIB ao fim de 2021 de 91,3% em Maio para 85,6% em Junho.
Não obstante a perspectiva de melhora dos indicadores de endividamento público, a IFI aponta que o quadro fiscal como um todo ainda “deve ser encarado com cautela”, pois a continuidade de pressões inflacionárias tem como decorrência o aumento das expectativas de mercado quanto a necessidade de maior restrição na política monetária, o que eleva o custo da dívida. Assim, se a melhora no cenário fiscal devido à inflação se concretizou agora, esse mecanismo de ajuste das contas públicas não é sustentável, ou seja, não retira da pauta a necessidade de reestruturação das finanças públicas tanto pelo lado dos gastos – o que já tem sido realizado com grandes custos de bem estar a população – quanto pelo lado das receitas com a reformulação de nosso sistema tributário confuso e regressivo.
O Boletim de Política Econômica do IREE é produzido pela economista-chefe Juliane Furno e pelos assistentes de pesquisa Daniel Fogo e Lígia Toneto.
Veja também:
Boletim Mensal de Política Econômica – Maio de 2021
Boletim Mensal de Política Econômica – Abril de 2021
Boletim Mensal de Política Econômica – Março de 2021
Boletim Mensal de Política Econômica – Fevereiro de 2021
Boletim Mensal de Política Econômica – Janeiro de 2021
Boletim Mensal de Política Econômica – Dezembro de 2020
Boletim Mensal de Política Econômica – Novembro de 2020
Boletim Mensal de Política Econômica – Outubro de 2020
Leia também

Super-ricos, tributação e desigualdade no Brasil
Continue lendo...
IREE Webinar: As armadilhas do déficit zero
Continue lendo...