Em 2016, quando eu cursava o segundo ano do ensino médio em uma escola técnica estadual (ETEC), estudantes secundaristas de diversas ETECs no estado de São Paulo se levantaram contra o governo Alckmin. Nossa principal reivindicação era que o governo estadual garantisse o oferecimento de merenda em nossas escolas que, apesar de públicas, não asseguravam esse direito básico para a permanência estudantil.
Poucos meses antes do início dessas manifestações, o governo de Alckmin havia sido acusado de participar da chamada “máfia da merenda”, um esquema de corrupção no fornecimento de merenda para as escolas do estado. Enquanto o governo era acusado de roubar dinheiro público, nossas escolas estavam em péssimas condições estruturais, nossos professores recebiam baixos salários e não tínhamos merenda.
Luiz Antonio Simas: Invenção do mundo
Luisa Mesquita fala sobre desafios do combate à lavagem de dinheiro
Diante desse cenário de extremo descaso, começa a surgir em São Paulo o movimento de ocupações nas escolas, que marcou a minha geração no movimento estudantil. Embora minha escola não tenha sido ocupada, realizamos diversas manifestações de rua e paralisações, até que a administração das ETECs se comprometesse em fornecer alimentação e construir uma cozinha em nossa escola.
É por essas e outras que a possibilidade de que Lula escolha Geraldo Alckmin como seu candidato a vice-presidente da República é como um tapa na cara de cada trabalhador e estudante deste país. Nas últimas semanas, Lula vem tentando justificar essa possibilidade com base em declarações públicas em que afirma que Alckmin é um “democrata”, capaz de ajudá-lo a “consertar o país”. Mas Alckmin vai “consertar” o país para quem?
Em seus mais de 8 anos à frente da administração pública paulista, Alckmin promoveu uma política de desprezo à educação pública e ao combate às desigualdades sociais. Mas, em contrapartida, atuou em favor da elite paulista. É a ela a quem sua política serve.
Para além do caso da “máfia da merenda” e da desvalorização de professores durante seu governo e das demais administrações tucanas, não podemos esquecer que foi Alckmin o responsável pelo massacre de Pinheirinho, uma reintegração de posse ilegal que expulsou famílias que moravam há mais de 8 anos em uma propriedade em São José dos Campos. A ação autorizada por Alckmin deixou centenas de pessoas feridas e, ainda hoje, é considerada um dos símbolos da violação aos direitos humanos no Brasil. O dono do terreno é o empresário Naji Nahas, que deve milhões de reais aos cofres públicos. Em 2022, o massacre completou 10 anos e, ainda hoje, o local permanece vazio, sem qualquer função social – o que é inconstitucional.
É preciso não ter medo de dizer que a política de Alckmin não serve aos trabalhadores deste país. A derrota de Jair Bolsonaro deve acontecer em prol de um novo projeto de país, que efetivamente combata o bolsonarismo. Se queremos um Brasil que garanta dignidade aos trabalhadores, que fortaleça a educação pública, gratuita e de qualidade, não é de Alckmin que precisamos.
Mas não só isso: com o golpe parlamentar contra Dilma Rousseff, deveria ter ficado mais do que evidente o fato de que a figura da vice-presidência não é um mero “enfeite”. Votar em Alckmin como vice significa assumir o risco de que ele poderá – circunstancial ou permanentemente – ser presidente do Brasil (e essa fórmula já se mostrou um desastre).
Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.
Letícia Chagas
Graduanda em Direito na USP, foi a primeira presidente negra do Centro Acadêmico XI de Agosto (2020-2021) e pesquisadora do Programa de Educação Tutorial (PET) Sociologia Jurídica. Atualmente, é coordenadora de pesquisa do Grupo de Pesquisa e Estudos de Inclusão na Academia (GPEIA).
Leia também

O Mendigo, os Leitores e os Polissílabos
Continue lendo...
Lei Anticorrupção completa 10 anos
Continue lendo...
Emendas parlamentares: histórico e influência
Continue lendo...