A situação paradoxal do mercado de trabalho no Brasil – IREE

Publicações CEE

A situação paradoxal do mercado de trabalho no Brasil

Confira aqui a análise sobre mercado de trabalho, desigualdades e políticas sociais produzida pelo Centro de Estudos Econômicos do IREE, na edição semanal do Boletim de maio de 2021! O mercado de trabalho brasileiro tem enfrentado uma situação aparentemente paradoxal: ao mesmo tempo em que cresce o nível de ocupação e a taxa de participação na força de trabalho, também cresce o total de desempregados.

A resposta para isso encontra-se na forma metodológica de averiguação do desemprego, que contabiliza como desempregados apenas aqueles que procuraram emprego na semana de referência da pesquisa domiciliar.

A principal marca da pandemia sobre o mercado de trabalho foi sentida menos na elevação do desemprego – que teve em torno de 4 milhões de pessoas acrescidas – e mais no contingente de pessoas que passaram a figurar no conceito de “população fora da força de trabalho”.

Isso significa que um contingente expressivo – em especial de mulheres – perderam seus empregos, mas não passaram a serem contabilizadas como desempregadas, uma vez que deixaram de procurar trabalho. Vários fatores concorrem para explicar esse cenário, sendo o principal a redução da mobilidade social em função do isolamento social.

No caso das mulheres, como já tratamos em Estudo Especial, 26% daquelas que saíram da força de trabalho com o início da pandemia alegaram não voltar a procurar trabalho por motivos ligados a necessidade de cuidados com filhos, enfermos e afazeres domésticos, atestando a profunda desigualdade de gênero no que tange ao não compartilhamento dos afazeres domésticos.

Os dados consolidados até fevereiro do ano corrente sugerem que o aumento do desemprego pari passu ao nível de ocupação foi ensejado pela maior retomada das atividades econômicas, uma vez que o desemprego estatisticamente cresce quanto mais as pessoas procuram trabalho.

Esse cenário deve reverter-se nos dados agregados de março e abril, em função da nova rodada de restrições as atividades econômicas por conta da segunda onda da Covid-19. Assim, é possível que a taxa de desemprego arrefeça nos meses consecutivos menos por uma maior absorção de trabalhadores e mais pelas restrições à procura de trabalho.

O Gráfico 2 apresenta a queda expressiva no total de trabalhadores no setor privado, especialmente entre aqueles que tinham vínculos mais sólidos de trabalho. Ao que tudo indica, pelos dados recentes, a recuperação do nível de emprego ocorrerá com ampliação do contingente de trabalhadores com vínculos mais flexíveis ou mesmo sem vínculo constituído. Ou seja, a tendência é que a recuperação ocorra com a criação de vínculos informais, deteriorando ainda mais a situação do mercado de trabalho que já vinha com nível elevado de trabalhadores informais antes da crise do Novo Coronavírus.

Além dos trabalhadores do setor privado sem carteira, a informalidade está presente em outras modalidades de ocupação, destacando-se a de “empregados” ou trabalhador “por conta própria” que não sejam portadores de CNPJ. Para esses trabalhadores a agenda é tanto a de geração de postos de trabalho – uma vez que foram os mais atingidos pela crise – quanto pela qualificação desses trabalhadores. A escolaridade média dos empregadores, no ano de 2020, era de apenas 13 anos de estudo para quem tinha CNPJ e apenas 10 anos para os que não detinham o registro. Entre os Conta Própria, os com CNPJ apresentavam uma média de 11,9 anos de estudo e os sem CNPJ de apenas 9,3. Ou seja, é um mito atribuir-lhes a característica de “empreendedor” uma vez que a média educacional é baixíssima e, portanto, a propensão à inovação também. Essas modalidades nada mais são que vínculos disfarçados de emprego ou situação de extrema vulnerabilidade, sem qualquer garantia de remuneração condizente com a reprodução da força de trabalho ao fim do mês.

Esse padrão de estrutura produtiva no Brasil é, inclusive, o que responde ao fato de que, segundo a extinta PNAD Covid, o total de trabalhadores em novembro de 2020 que estavam exercendo atividades em home office chegava, apenas, a 10% da população.

Do ponto de vista da redução das desigualdades sociais, um estudo recente do MADE/USP calcula o papel do investimento em educação, especialmente nos níveis básicos, na redução das desigualdades sociais. Segundo o estudo, como um todo, o impacto da educação pública sobre a desigualdade representa uma redução do Índice de Gini entre 5,22%, a partir de dados POF, e 9,62%, considerando informações do Inep.

Aliás, o Brasil – dentre o conjunto dos países latino americanos – é o que mais logra reduzir a desigualdade social após a aplicação das políticas sociais, uma vez que nosso sistema de saúde, educação e seguridade social tem dimensão universal e capilarizada no território. Dessa feita, já temos indicado em boletins passados a importância da política fiscal nesse momento de crise com alargamento das desigualdades sociais. O gasto do Estado, principalmente o gasto deficitário, logra maiores efeitos multiplicadores na economia, uma vez que a população beneficiária das políticas públicas desponta como o contingente que tem maior propensão marginal a consumir, contribuindo de forma anticíclica com a espiral recessiva típica de períodos prolongados de crises.

O Boletim de Política Econômica do IREE é produzido pela economista-chefe Juliane Furno e pelos assistentes de pesquisa Daniel Fogo, Lígia Toneto e Matias Rebello Cardomingo.

Veja também:

Boletim Mensal de Política Econômica – Abril de 2021

Boletim Mensal de Política Econômica – Março de 2021

Boletim Mensal de Política Econômica – Fevereiro de 2021

Boletim Mensal de Política Econômica – Janeiro de 2021

Boletim Mensal de Política Econômica – Dezembro de 2020

Boletim Mensal de Política Econômica – Novembro de 2020

Boletim Mensal de Política Econômica – Outubro de 2020



Leia também