Com o início da Copa do Mundo Feminina de 2023, muito tem se falado sobre a atuação das jogadoras em campo, mas será que todos e todas sabem que o futebol, considerado nossa paixão nacional, já foi proibido de ser praticado por mulheres, por quase 40 anos em nosso país?
A história do futebol feminino é marcada pela luta constante afim de se superar as barreiras sociais e culturais impostas às mulheres. Desde o seu surgimento, no final do século XIX, fomos desencorajadas a participar desse esporte, considerado incompatível com os nossos corpos e que poderia nos “masculinizar”.
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No Brasil, a chegada do futebol feminino remonta ao início do século XX, porém em 1941 foi proibido por lei (junto de outros esportes) de ser jogado por mulheres, proibição que deixou de existir apenas em 1979. Com o fim da restrição, apenas na década de 80 é que o futebol feminino ressurgiu no Brasil.
A criação de clubes e competições regionais deu início a uma nova era, entretanto o reconhecimento oficial demorou a chegar e a modalidade ainda sofreu com a escassez de recursos e pouco apoio. Foi somente no ano 2000 que houve uma mudança significativa de interesse por parte do público, da mídia e a profissionalização de algumas atletas.
O Brasil produziu e continua a produzir grandes talentos como a nossa maior estrela Marta, uma das melhores jogadoras de todos os tempos, 6 vezes considerada a melhor do mundo, maior artilheira da história das Copas do Mundo Femininas, ultrapassando a marca de 17 gols em edições do torneio, além de ser a maior artilheira das seleções, masculinas e femininas. Ela, junto de nossas outras craques, têm inspirado gerações de meninas brasileiras a seguirem seus passos.
A seleção brasileira feminina de futebol, conhecida como “Seleção Canarinho”, é uma das mais fortes do mundo e tem sido um importante símbolo do futebol mundial. A equipe alcançou excelentes resultados em competições internacionais, como a conquista do vice-campeonato na Copa do Mundo Feminina da FIFA em 2007 e a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Atenas em 2004 e Pequim em 2008.
Apesar do considerável crescimento e avanço, o futebol feminino no Brasil ainda enfrenta desafios como a falta de investimentos e patrocínios, a disparidade salarial em comparação com os jogadores do sexo masculino e a pouca visibilidade nos meios de comunicação.
Nos últimos anos, houve a tentativa de conscientização sobre a importância da igualdade de gênero no esporte, incluindo o futebol feminino. Movimentos e campanhas têm sido criados para promover a valorização das jogadoras, a igualdade salarial e o aumento do apoio ao esporte, porém sabemos que ainda falta muito.
Um dos principais desafios enfrentados é sem dúvida o desenvolvimento de base. Para impulsionar o crescimento da modalidade, é fundamental investir em infraestrutura, programas de treinamento e competições para as jovens jogadoras. A criação de escolinhas de futebol feminino e a valorização do esporte nas escolas são ações cruciais para identificar e desenvolver talentos desde cedo.
Outra questão-chave é o financiamento da modalidade: historicamente, os recursos destinados às mulheres têm sido significativamente menores do que os destinados aos homens. Isso se reflete em salários mais baixos para as jogadoras, na falta de incentivos para clubes investirem em times femininos e em uma menor cobertura midiática dos jogos e competições. É fundamental que empresas, patrocinadores e governos invistam mais no futebol feminino para garantir sua sustentabilidade e crescimento contínuo.
A profissionalização também é um marco importante. Embora o número de atletas profissionais venha aumentando, ainda há muitas jogadoras que precisam conciliar a carreira no esporte com outras atividades para sustentar-se financeiramente. A criação de ligas profissionais mais estruturadas, com salários justos e oportunidades de crescimento na carreira, é essencial para atrair e reter talentos e permitir que as jogadoras se dediquem integralmente ao futebol.
É certo que a promoção do futebol feminino começa em casa e na sociedade como um todo, por isso devemos combater estereótipos de gênero que desencorajam meninas a jogarem e incentivar o apoio familiar para que elas possam seguir seus sonhos no esporte. Além disso, é importante promover a igualdade de oportunidades nas escolas e clubes, para que meninas e meninos tenham as mesmas condições.
A educação e a formação das jogadoras também são fundamentais para o desenvolvimento não apenas como atletas, mas também como cidadãs. Programas que incentivem a educação e a capacitação das jogadoras em questões como liderança, saúde, nutrição e outros aspectos da vida.
O futebol feminino promove a inclusão social, dando oportunidades a mulheres de diferentes origens e culturas. Ele quebra barreiras e aproxima pessoas em torno do amor pelo esporte, independentemente de sua identidade de gênero, raça, etnia ou nacionalidade. Além disso, o esporte pode ser usado como uma ferramenta para promover questões sociais importantes, como a educação, saúde, igualdade de gênero e outros temas relevantes.
Dessa forma, é evidente que a crescente aceitação e o reconhecimento do futebol feminino refletem em uma sociedade mais igualitária e progressista. O esporte desempenha um papel fundamental na mudança de mentalidades e na quebra de estereótipos de gênero enraizados na sociedade, incentivando uma visão mais equitativa de homens e mulheres em todos os setores da vida.
O futebol feminino é importante não apenas como uma forma de entretenimento esportivo, mas também como um instrumento de transformação social e luta pela igualdade de gênero. Ao dar voz às mulheres e abrir caminho para seu empoderamento, ele influencia positivamente a vida de muitas pessoas e contribui para uma sociedade mais justa e inclusiva.
Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.
Danielle Zulques
É Diretora para assuntos de política e sociedade do IREE. Advogada formada pela FAAP e pós-graduada em Ciências Políticas pela FESPSP. É Coordenadora da CAUSA - rede que conecta advogadas a mães em busca de suporte legal.
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