Domingo, dia 15 de março de 2020, assistimos com assombro a participação do Presidente Jair Bolsonaro nas manifestações da direita em Brasília.
Os absurdos desse comportamento do Presidente da República são inúmeros. Sobre a pandemia mundial da Covid-19, doença provocada pelo novo coronavírus, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que sejam evitadas aglomerações e pede a realização de quarentena para viajantes que retornam do exterior em situações de risco.
O Presidente, que voltou recentemente dos EUA, descumpriu ambas, de uma tacada só, e ainda deslegitimou o trabalho do seu próprio Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Marcou presença na manifestação por mais de uma hora, manuseou celulares de terceiros para selfies e, inclusive, usou o boné de um manifestante. Ignorou, obviamente, a quarentena de 14 dias ao sair de casa mesmo sabendo que mais de uma dezena de integrantes da sua comitiva testou positivo para o coronavírus.
Para além da atitude irresponsável daquele que deveria justamente dar o exemplo e transmitir serenidade à população, o comportamento do Presidente revela o desespero do Executivo diante da pior crise institucional da sua gestão.
Existe hoje uma crise entre o Executivo e o Legislativo, que atingiu seu ápice na discussão sobre o orçamento impositivo e provocou a ira dos apoiadores do atual governo, que pediam nas ruas o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal.
Apesar do fim oficial da campanha presidencial em outubro de 2018, é notório o estado de campanha permanente da gestão Bolsonaro, seja animando seus fiéis seguidores com comentários polêmicos nas redes sociais ou provocando adversários e mantendo o clima de tensão constante.
Há quem diga que se trata de uma estratégia do tipo “cortina de fumaça” para a blindagem da discussão sobre os reais problemas do País. A estratégia pode ter funcionado em outro contexto, quando o apoio da população era maior – atualmente não passa de 30% –, e havia expectativa da recuperação da economia pelo mercado financeiro. Hoje sabemos que o cenário é justamente o oposto.
A crise entre os Poderes – vale dizer, provocada essencialmente pelo próprio Executivo, já que pesquisas mostram o forte governismo por parte do atual Congresso – exigiria uma atitude cautelosa do Presidente frente aos dois principais membros do Legislativo, os presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM).
Não bastasse ter participado de uma manifestação contra instituições fundamentais da democracia, Bolsonaro afirmou em entrevista televisiva no domingo à noite que ambos, Maia e Alcolumbre, também deveriam estar nas ruas e não em reuniões de gabinetes com ar condicionado.
Assim não há campanha permanente que consiga resolver a crise econômica e política pela qual o governo Bolsonaro passa, já que, além de tudo, os ganhos efetivos das manifestações do dia 15 de março foram pífios. O que se viu foram algumas centenas de apoiadores radicais bradando frases vazias de efeito.
Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.
Carolina de Paula
É doutora em Ciência Política pelo IESP/UERJ, Diretora Executiva do DataIESP e consultora da UNESCO. Coordenou o "Iesp nas Eleições", plataforma multimídia de acompanhamento das eleições de 2018. Foi coordenadora da área qualitativa em instituto de pesquisa de opinião e big data, atuando em diversas campanhas eleitorais e pesquisas de mercado. Escreve mensalmente para o IREE.
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