A ala crítica da aliança petista – IREE

Colunistas

A ala crítica da aliança petista

Yuri Silva

Yuri Silva
Jornalista



Os burburinhos sobre uma possível e surpreendente aliança entre o ex-presidente Lula e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin para formação da chapa presidencial mais competitiva de 2022 têm sido acompanhados de análises sobre o quão à esquerda ou à direita essa coalizão estaria no espectro político nacional.

Mais do que isso, geram receios e desconfianças em ambos os pólos democráticos: à direita, que cada dia que passa vê naufragar mais fundo o sonho da chamada terceira via, e à esquerda, que assiste escapar aos dedos a possibilidade de um sonhado Governo Lula III com bases progressistas avançadas, sem tantas conciliações de classe.

O que não aparece tão cotidianamente nas análises é o fato de que ambos os lados, à direita ou à esquerda, parecem sair dessa aliança com pontos positivos a comemorar – o que talvez seja um fato que fortaleça o namoro entre o ex-tucano e o cacique petista.

À direita, não é irrelevante o dado de que Alckmin, abatido no tabuleiro eleitoral nacional após as derrotas de 2006 e 2018, retornaria em posição privilegiada como vice-presidente da República para os convescotes do poder e passaria a disputar espaço no hall de nomes naturais à sucessão do ex-presidente Lula, que fará um governo de transição e reconstrução nacional após, provavelmente, derrotar Bolsonaro e seu projeto fascista.

Já à esquerda, há de se observar que mais um governo conciliador do PT, sob o comando da sua maior liderança, abre espaço para a instalação de uma ala crítica à esquerda dentro da aliança, herdeira dos votos progressistas, mais radicais e, portanto, beneficiária automática de um iminente processo de renovação da (centro-)esquerda no Brasil.

Nesse segundo caso, a ala crítica da aliança petista ocupa não somente um lugar no testamento político do lulopetismo, mas, a curto prazo, um espaço eleitoral relevante em 2022, quando o eleitor cansado da tática de conciliação buscará compensar seu voto da chapa presidencial ao escolher governadores, senadores e deputados federais e estaduais mais alinhados a bandeiras mais identificadas com a esquerda política.

Lula e Alckmin se encontram em jantar em dezembro de 2021. Foto: Ricardo Stuckert/ Divulgação

Descendente natural do petismo no espectro político em que se coloca, o PSOL, sob a liderança do pré-candidato a governador de São Paulo Guilherme Boulos, passa a cumprir uma tarefa de destaque neste cenário. Dependerá da competência na execução desta tarefa a evolução do partido de mero descendente para herdeiro político do projeto popular até aqui liderado pelo PT neste campo.

Decidido a apoiar Lula já no primeiro turno, posição que a maioria dos filiados deve manter na Conferência Eleitoral que fará ainda no primeiro semestre do ano, o partido tem a obrigação de se posicionar como parte do projeto que unificou a esquerda e setores democráticos da política nacional para derrotar o bolsonarismo e seus signos e símbolos. Será esse posicionamento a nos diferenciar da extrema-esquerda sectária e antipovo que flerta com o fascismo para se auto-construir e disputar pequenos poderes.

Mas caberá ao PSOL também, no entanto, posicionar-se a favor de uma agenda à esquerda do que o PT é ou será capaz de apresentar na aliança que se avizinha, seja na campanha eleitoral seja no governo que virá depois e do qual teremos que fazer parte.

Longe dos papéis de subalternização, o partido disputará o comando deste projeto político ao tempo que conseguir se apresentar como alternativa política independente, porém responsável e conectada com as lutas populares mais legítimas. Entendendo que somos o futuro da esquerda brasileira e, para isso, temos que disputar o poder real e não as franjas.

Só assim a ala crítica da aliança petista se reverterá na linha de frente que comandará um projeto de futuro, sem espaço para a direita tradicional que não seja o de linha auxiliar das nossas concepções políticas. Boric e o povo do Chile nos ensinaram sobre isso.



Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.

Yuri Silva

É Diretor de Políticas de Combate e Superação do Racismo, no Ministério da Igualdade Racial. Foi Coordenador de Direitos Humanos do IREE. Jornalista formado pelo Centro Universitário Jorge Amado, é coordenador nacional licenciado do Coletivo de Entidades Negras (CEN), editor-chefe do portal Mídia 4P – Carta Capital, e consultor na área de comunicação, política e eleições. Colaborou com veículos como o jornal Estadão, o site The Intercept Brasil, a revista Piauí e jornal A Tarde, de Salvador. Especializou-se na cobertura dos poderes Executivo e Legislativo e em pautas relacionadas à questão racial na sociedade de forma geral e na política. É Membro do Diretório Estadual do PSOL de São Paulo.

Leia também