As vitórias de Arthur Lira (PP) e Rodrigo Pacheco (DEM) para a presidência da Câmara dos Deputados e do Senado representam, sem dúvida, uma vitória de Jair Bolsonaro (sem partido).
O envolvimento do presidente na disputa foi explícito, fala-se até mesmo em pagamentos bilionários de emendas extraordinárias, indicações políticas e todo o repertório do outrora repudiado “toma lá dá cá” para a obtenção de votos. Porém, o alcance dessa vitória precisa ser observado com parcimônia.
Estava óbvio que nos últimos tempos a relação de Rodrigo Maia (DEM) com o Presidente e seus Ministros, particularmente o Ministro da Economia, Paulo Guedes, andava de de mal a pior. Mas vale lembrar que da perspectiva macroeconômica, o antigo comando das Casas – Maia na Câmara e Davi Alcolumbre (DEM) no Senado – não conflitava significativamente com a agenda do Planalto.
Pode-se afirmar que da perspectiva política, no que diz respeito ao aumento da segurança do término do mandato sem a abertura de um processo de impeachment (há mais de uma dezena de pedidos protocolados), a vitória de Bolsonaro foi significativa.
Por outro lado, Lira possui experiência política e bom trânsito entre os parlamentares, sendo dotado de ambições próprias. Ou seja, afirmar que se tratará de um mero agente do presidente é uma análise ingênua.
A expectativa de que Lira seja complacente à “agenda de costumes” do Planalto pode ser frustrada devido ao contexto de crise sanitária que urge prioridades em outras searas como, por exemplo, a discussão sobre o retorno do auxílio emergencial, ou medida similar, que socorra a população que segue sem renda.
Além do mais, as eleições de 2022 já se avizinham, e a base parlamentar que elegeu Lira, o fisiológico “Centrão”, costuma se guiar por perspectivas racionais eleitorais bastante fortes.
Em outras palavras, para avançar a agenda conservadora – que felizmente pouco caminhou durante a presidência de Maia e Alcolumbre – Lira e o “Centrão” correrão o risco de serem acusados de omissão pelo eleitorado e, no limite, de comprometerem a própria reeleição nas urnas.
A eleição para deputados é permeada de decisões muitas vezes pontuais por parte do eleitorado, como a posição do seu parlamentar em determinadas votações ou na ausência de posição sobre um assunto específico.
Há quem especule que os deputados fisiológicos do “Centrão” são justamente os representantes do eleitor conservador, que em tese almejaria o avanço da agenda de costumes.
Trata-se de uma análise bastante simplista sobre a conexão eleitoral no Brasil não levar em consideração a diversidade de modelos de representação desse grupo extremamente heterogêneo de parlamentares. Isso sem falar que enquanto as mortes pela Covid-19 não diminuírem, a imunização da população não avançar e a economia não reagir, soará esquizofrenia a priorização de uma agenda de costumes.
Os artigos de autoria dos colunistas não representam necessariamente a opinião do IREE.
Carolina de Paula
É doutora em Ciência Política pelo IESP/UERJ, Diretora Executiva do DataIESP e consultora da UNESCO. Coordenou o "Iesp nas Eleições", plataforma multimídia de acompanhamento das eleições de 2018. Foi coordenadora da área qualitativa em instituto de pesquisa de opinião e big data, atuando em diversas campanhas eleitorais e pesquisas de mercado. Escreve mensalmente para o IREE.
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